Nem sempre são os melhores, piores, maiores e outros superlativos do ano que mais nos marcam. Podemos recordar mais vivamente um choque de expectativas, com um jogo a deixar-nos de olhos arregalados com a sua qualidade (ou falta dela), que contraria o histórico da série, da desenvolvedora ou do género. Ou podemos ficar surpreendidos com a mera existência de uma certa experiência, que não era de todo antecipável com base na das produtoras. Ou então, aquele título que prometia ser mais um lançamento como todos os outros acaba por suscitar uma reação inesperada dos jogadores ou das desenvolvedoras, fazendo correr rios de tinta e verborreias explosivas sobre o paradigma vigente na indústria e na sua sustentabilidade global (sim, estamos todos a pensar no mesmo jogo).
A indústria de videojogos já se desenvolveu ao longo de décadas, mas não atingiu um plateau. Mudam-se os tempos, mudam-se as vontades de jogadores, editoras e desenvolvedores, o que dita desenvolvimentos constantes nas experiências produzidas. Nunca foi tão estimulante jogar, acompanhar e debater sobre videojogos, e vários dos lançamentos de 2024 foram emblemáticos desta permanente evolução. Por isso, neste artigo partilharemos as nossas maiores surpresas do ano, aquelas experiências que, daqui a 20 anos, serão a palavra gatilho para fazer eclodir uma enchente de memórias. "2024?... Ah, o ano do Suicide Squad!"
Pessoalmente, a maior surpresa do ano surge sob a forma de um renascer de um clássico que eu não fazia ideia que existia. Falo de
Shadow of the Ninja: Reborn! Um jogo mais velho do que eu, cuja versão original nunca se tinha sequer aproximado do meu radar, e que este ano tive o prazer de descobrir. Jogabilidade
old school desafiante, níveis em
side-scrolling que são divertidos de explorar, e um deleite tanto para os olhos como para os ouvidos; o remake deste clássico tem tudo o que gosto de ver num jogo! Se mais clássicos como este continuarem a sair da sombra, serei um jogador bem feliz.
Filipe Martins - Concord
A categoria “Surpresa do Ano” vai para Concord, um jogo que conseguiu surpreender não pelo seu sucesso, mas pelo seu percurso absolutamente peculiar. Após oito anos em desenvolvimento, um esforço que certamente envolveu dedicação e sonhos, o jogo finalmente viu a luz do dia… mas apenas por duas semanas, antes de ser cancelado e desaparecido de cena. Dois extremos que tornam difícil não levantar uma sobrancelha.
Parte do enigma de Concord reside no facto de ter tentado entrar num mercado já saturado: o dos shooters competitivos. Por mais visualmente apelativo ou tecnicamente competente que fosse, o jogo trouxe poucas novidades ao género e acabou por não conseguir diferenciar-se num espaço onde os gigantes já dominam e os novos concorrentes têm de trazer algo realmente revolucionário. Este fator, aliado a uma receção morna e a uma campanha de marketing quase inexistente, ditou o seu destino antes mesmo de ter uma chance justa.
No final, Concord parecia estar com o caminho traçado desde o início. Pouca publicidade, poucas inovações e um género altamente competitivo acabaram por fazer deste título um caso perdido, mesmo antes de verdadeiramente começar. Um lembrete agridoce para as editoras de que é fundamental pensar cuidadosamente no género em que investem – porque, no final, são sempre os jogadores que ditam as regras do mercado. E, quando essas regras não são respeitadas, mesmo oito anos de trabalho podem não ser suficientes para evitar o fracasso.
“Astro’s Playroom” já tinha incrível, na altura até me questionei: “como pode um jogo gratuito ser tão bom?”. Com várias mecânicas para apresentar o Dualsense (na altura novidade), bastante divertido e com níveis muito variados. Seguindo a mesma temática, mas com muitas melhorias, é lançado este ano a “sequência” deste título, intitulado desta vez de “Astro Bot”. Tive o prazer de jogar este jogo no seu lançamento e até escrever uma análise sobre o mesmo para o nosso site. Não há palavras para descrever “Astro bot”, foi sem dúvida o jogo que mais me divertiu em 2024, algo que sinceramente tem sido difícil de acontecer uma vez que muitos jogos já me aborrecem. Assim sendo, dou o prémio de surpresa do ano a Astro Bot, pela capacidade de me surpreender a cada nível que jogava e por ter sido o jogo que mais me deu gosto jogar dia-após-dia.
As consolas são como o vinho: quanto mais velhas, melhores são. Os anos iniciais de uma consola são extremamente previsíveis. Serve-se mais um Zelda, mais um Halo, mais um Mario 3D; jogos muito aguardados, de facto, mas cuja existência é tão garantida como a de um novo pôr do sol. É numa fase tardia que as empresas vão raspar o fundo do seu leque de propriedades intelectuais, para nos entregar experiências inusitadas, mas com tanta ou mais qualidade do que as séries mais sonantes da indústria.
O oitavo ano de vida da Nintendo Switch brindou-nos com duas gigantescas surpresas: Emio: The Smiling Man - Famicom Detective Club e Mario & Luigi: Brothership. Como já elaborei no artigo da Melhor Narrativa, Emio foi um lançamento disruptivo pelos seus temas adultos e sensíveis, que são raríssimos nos jogos first-party da Nintendo e que, quando efetivamente são abordados, nunca chegam perto da maturidade e candidez presentes em The Smiling Man. Foi um lançamento entusiasmante não só pela sua qualidade intrínseca, mas também por me revelar novas possibilidades para os jogos da Nintendo e um entusiasmo renovado para descobrir o que o futuro trará.
Digo-vos isto para que possam perceber o quão inesperado Brothership teve de ser para mim para conseguir exceder a surpresa despoletada por Emio e ser a minha escolha para esta categoria. O último lançamento da série foi um colossal fracasso comercial, ao ponto de causar a falência da sua companhia de desenvolvimento - contudo, contra todas as expectativas, a Nintendo apostou e apoiou um novo jogo da série. A última entrada original na saga, Paper Jam Bros. era uma experiência abismal, com uma história e mundo entediantes que cuspiram no potencial da sua premissa; além disso, a equipa de desenvolvedores por trás do novo projeto é quase totalmente novata na série - no entanto, a jogabilidade, personagens e charme de Brothership gritam Mario & Luigi com o timbre confiante e ousado dos magníficos clássicos. Enquanto fã acérrimo da série desde a tenra infância, não podia estar mais encantado com este renascimento sublime de Mario & Luigi.
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Introdução e Edição do Texto por Tiago Sá
Thumbnail e Imagens de Texto por Carlos Cabrita
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