Em termos de conteúdo e estilo de
jogo, Master Detective Archives: RAIN CODE era perfeito para a Nintendo Switch.
O seu grafismo estilizado mas caprichado encaixa como uma luva no catálogo
da consola, e o seu foco em mistérios e estrutura episódica tornam-no perfeito
para jogar no metro, na cama, na sanita. Porém, se esta camisa servia a Rain
Code, tinha pontos em que estava prestes a rebentar pelas costuras: basta darem
uns passos pelos becos inundados de Kanai Ward para verem a taxa de fotogramas
a cair mais impetuosamente do que a constante chuva desta cidade e vários flickers
de textura a prejudicar a imersão nas cinemáticas dinâmicas do jogo.
Consequentemente, um salto para
outras plataformas mais poderosas era exatamente o que este jogo precisava para
poder ser a melhor versão de si mesmo. E é aí que entra Master Detective
Archives: RAIN CODE Plus, a edição melhorada para a Steam, PlayStation 5 e Xbox
Series do ex-exclusivo da Nintendo Switch. De facto, a mudança de plataformas
fez um mundo de diferença na performance. Neste regresso a Rain Code, alternei a jogabilidade entre o meu PC principal, onde pude admirar os hipnotizantes locais néon chuvosos
de Kanai Ward em 4K ou 120FPS (ainda não vivo no mundo idílico em que o meu rig me deixa combinar o melhor dos dois mundos), e a Steam Deck, por ser incapaz de prescindir da tão amada
portabilidade. Em ambas as plataformas, os efeitos visuais aberrantes evaporaram-se
por completo, e pude desfrutar um nível de fidelidade gráfica e fluidez com que a versão Switch só
pode sonhar.
Dentro das plataformas onde encontramos este relançamento,
a Steam Deck é indubitavelmente a opção mais tacanha e humilde de as experienciar;
ainda assim, os resultados merecem um selo de aprovação. Com a melhor fidelidade possível
que as opções gráficas de Rain Code e a consola permitem (preset Ultra,
em 720p), o título mantém-se firme nos 50FPS (que foi o teto que definimos manualmente) durante a esmagadora maioria do tempo. De
longe a longe, lá vem uma queda para os 40FPS, e até já aconteceu a framerate tropeçar até aos 30FPS, mas lá está: as inconsistências são menos pronunciadas em termos
proporcionais face à versão Switch e por isso menos evidentes, e certamente estas
poderiam ter sido erradicadas se eu diminuísse os parâmetros gráficos
nas definições. Sem qualquer ajuste, o pior cenário possível na performance da
Steam Deck supera o melhor concebível na edição Nintendo Switch.
Por mais que este refinamento
gráfico seja bem-vindo, é a possibilidade de novos jogadores conhecerem Rain Code que mais me entusiasma. Para além da satisfação resoluta de ter
experienciado uma história muito imaginativa e com cabeça, tronco e membros, o
final desta aventura preencheu-me do sôfrego anseio de conhecer mais deste
mundo, de conhecer outra narrativa igualmente genial, mas com mistérios mais
complexos e difíceis de resolver.
Reviver esta campanha um ano mais tarde em nada altera este desejo, e muito menos a minha opinião: esta história continua a apresentar um conjunto de homicídios extremamente fáceis de decifrar em comparação com outras propostas do género, e toma demasiados atalhos no processo de investigação e deciframento da verdade. Inclusivamente, os seus minijogos de dedução são variados e compreendem uma evolução positiva face a Danganronpa, mas em certos momentos sufocam-se com as suas próprias limitações e trivializam a (já de si parca) dificuldade. Contudo, no grande plano, Rain Code ostenta uma história central recheada de revelações memoráveis e geniais, centrada numa cidade e personagens marcantes e ricamente caracterizadas. Mais do que simplesmente deslindar pequenos e grandes mistérios, a narrativa desenvolve metodicamente temas como o valor de verdades inconvenientes e a busca de um significado pessoal, num processo que culmina num fervoroso e recompensante clímax que me impele a conceder perdão a todos os defeitos da campanha sem sequer a fazer rezar os típicos dez Avé Maria.
Se alguma coisa, este regresso à história deu-me um
maior apreço pela narrativa coesa e estruturada de Rain Code. Não só me ri de
certos set-ups elaborados que eu já sabia que iriam ser deliciosamente
subvertidos mais tarde, mas também fiquei pasmo com as espessas camadas de foreshadowing
extraordinário: muitas das linhas aparentemente inócuas a que não fizera
caso na minha jogatina original ganharam novo significado, deixando-me
surpreendido com a capacidade do jogo de passar tantas pistas debaixo do meu nariz sem despertar minimamente o meu faro. Se quiserem conhecer melhor a
história, mistérios e mecânicas de Rain Code, recomendamos que leiam a nossa análise original do jogo; continuar a elaborar nestes aspetos apenas faria chover no molhado.
Não pensem que, por causa deste recambiamento,
não há mais nada a discutir sobre Kanai Ward e as suas personagens! Para além
de me permitir reviver memórias felizes, RAIN CODE Plus estendeu-me a
oportunidade de formar algumas novas, graças à inclusão dos conteúdos do Season
Pass sem custos extra (tornando Plus na edição definitiva na relação
preço-conteúdo). Estes consistem em cinco episódios de 30 minutos de história
extra, e em cada um controlamos um dos detetives aliados do protagonista Yuma
Kokohead.
Na minha cabeça, antes de os
iniciar, julgava que iria encabeçar novas investigações comparáveis aos enigmas
do jogo base, em que os Mystery Labyrinths do jogo base seriam trocados por explorações mais aprofundadas dos poderes dos detetives (os ditos Forensic Fortes) e por interrogatórios com deduções
pelo meio, muito à semelhança de Ace Attorney Investigations. No entanto, estas
intermissões estão mais em linha com versões mais elaboradas das sidequests
do jogo.
Unir todos os episódios debaixo
do mesmo guarda-chuva não é fácil: para além de uma duração equivalente, não há
grandes elos comuns entre eles. Três mini-histórias orbitam em torno de homicídios
misteriosos; as outras duas não. Uma delas coloca-nos diretamente a controlar a
habilidade especial do detetive; mais nenhuma o faz. Em duas delas temos a
oportunidade de fazer um punhado de deduções; nas restantes, não fazemos
nada para além de caminhar em frente e ler caixas de texto.
Em termos de jogabilidade, nada é
acrescentado ao que já foi visto na história principal; em termos narrativos, todas
as histórias são interessantes e bem desenvolvidas no curto tempo que dispõem, e aplicam de um modo refrescante o Forensic Forte do seu protagonista ao mesmo tempo que exploram animadamente as pequenas ideossincrasias da sua personalidade. É até surpreendente o quanto estes "contos" variam entre si em estrutura e premissas, nunca parecendo formulaicos. Contudo, só um destes capítulos aprofunda declaradamente o passado da sua personagem e
estabelece uma (pequerruchinha) ponte para o futuro de Master Detective Archives.
Por isso, se querem tirar o máximo proveito delas, não as vejam como um
complemento essencial à experiência Rain Code, mas sim como uma desculpa para passar
mais alguns momentos na companhia da Nocturnal Detective Agency.
Se porventura já jogaram Rain
Code e estas DLCs na Nintendo Switch, este pacote só tem uma adição
completamente nova para vos oferecer: uma galeria de cinemáticas e música, onde
podemos facilmente assistir a momentos chave da história ou ouvir os nossos
temas favoritos da excelente banda sonora. Não vou recusar esta novidade,
mas também não vou andar aos pulos com entusiasmo. Na verdade, acho questionável que a galeria seja um advento da versão Plus, e que não tenha sido
adicionada numa atualização gratuita à versão Nintendo Switch. Esta exclusividade faria mais sentido se existisse uma galeria de artes conceituais ou um punhado
de remixes da banda sonora, tal como nalgumas remasterizações e compilações
da Konami e CAPCOM, mas seria injusto julgar este port bastante
completo por esta omissão.
Conclusão
Melhorando a performance da
campanha e incluindo os conteúdos DLC para formar um pacote completo, Master Detective Archives:
RAIN CODE Plus é a versão definitiva da história entusiasmante de Yuma
Kokohead. Se não o fizeram antes, esta é a melhor oportunidade para mergulharem
nos mistérios e mundo inigualado desta experiência – pese embora a persistência
das lacunas ao nível da dificuldade e jogabilidade, difíceis de mitigar sem comprometer a visão da versão original.
O melhor:
- Resolução dos problemas
técnicos;
- Inclusão dos conteúdos DLC do
lançamento original, sem inflacionamento do preço;
- A mesma história, mundo e
personagens fascinantes e envolventes…
O pior
- …e a mesma dificuldade diminuta e jogabilidade
em conflito consigo mesma;
- Pobre interatividade nas
substories.
Nota do GameForces: 8.0/10
Desenvolvedora: Too Kyo Games/Spike Chunsoft
Publicadora: Spike Chunsoft
Ano: 2023-2024
Nota: Esta análise foi realizada com base na versão Steam do jogo, através de um código gentilmente cedido pela Spike Chunsoft. As imagens na proporção 16:10 foram capturadas na Steam Deck, enquanto as restantes foram capturadas no computador principal do redator.
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