Análise | Shadow of the Ninja: Reborn – Clássico com a Merecida Saída da Sombra


Se fizer bem as contas – algo que, neste caso, não gosto de fazer -, já lá vão cerca de 20 anos desde que me cruzei pela primeira vez com o fascinante mundo dos videojogos. Era bem pequenino quando tal aconteceu, é certo, mas o facto de nunca mais ter largado este hobby, leva-me a afirmar, cheio de garimpa, que há muitos poucos jogos que eu não conheça, nem se que seja apenas de nome, na pior das hipóteses. Pois bem, hoje venho falar-vos da remasterização de um clássico que eu desconhecia profundamente até aqui há umas semanas, quando um dos chefões aqui da GameForces o referiu – Shadow of the Ninja: Reborn! Como o meu frágil orgulho não aguenta não saber da existência de um jogo, aceitei o desafio de o analisar, e, por isso, estou aqui para responder à pergunta: será este um renascer glorioso, ou será esta uma experiência que nunca devia ter saído das sombras?


Em Shadow of the Ninja: Reborn, mergulhamos num mundo distópico no (já não muito) distante ano de 2029, altura em que um maléfico exército de demónios liderado pelo malvado Garuda invade e toma os Estados Unidos. Mas quando o mal expande a sua influência neste mundo, há uma força mortífera que sai das sombras para o defender os inocentes: os ninjas. É aqui que entram os nossos heróis, Hayate e Kaede, dois ninjas de um lendário clã que recebem a missão de infiltrar a fortaleza do tirânico Garuda de modo pôr fim à opressão levada a cabo pelo mesmo e restabelecer a paz.

Como seria de esperar de um jogo que viu, pela primeira vez, a luz do dia há mais de três décadas, a narrativa aqui presente é pouco mais do que uma ligeira desculpa para nos colocar em ação. Tanto assim é que apenas descobri que existe sequer uma narrativa na minha terceira ou quarta sessão de jogo, em que me distraí com a minha gata a dormir numa pose engraçada, e o jogo passou do menu inicial para uma cutscene de exposição narrativa. O jogo nem tomou a iniciativa de me mostrar a história, teve de ser o meu défice de atenção - e a minha demanda em encher a memória do meu telemóvel com fotos de coisas giras e fofas que a minha gata faz - a entrarem em cena para que tal acontecesse.

Mas ainda bem que não é pela história que procuramos títulos desta natureza, sendo antes pela jogabilidade de plataformas e ação. E aqui, Shadow of the Ninja: Reborn evidencia toda a sua qualidade. As mecânicas são relativamente simples – dispomos de um salto, de um ataque de espada, de um ataque com um Kusarigama (uma espécie de faca agarrada a uma corrente que se pode atirar e recolher), e de um desvio lateral. Geralmente, o objetivo é navegarmos por níveis em 2D, saltitando de plataforma em plataforma, correndo por e trepando paredes, e derrotando inimigos que ousem atravessar-se no nosso caminho, até chegarmos ao fim de uma área ou de um nível.


É uma simplicidade agradável e que confere uma sensação de competência desde o primeiro momento da campanha deste título. Sensação essa rapidamente colocada à prova, uma vez que é no design de níveis que emerge o desafio e, convenhamos, a diversão de Shadow of the Ninja. Isto porque os ambientes em 2D estão recheadíssimos de subordinados de Garuda, cuja estratégia não passa apenas pela quantidade de capangas, mas pela sua variedade. Cada nível obriga-nos a enfrentar hordas compostas por uma variedade impressionante de inimigos, cada qual com o seu padrão de ataques e leque de habilidades únicos. De facto, cada área nova introduz um ou vários novos inimigos, obrigando-nos a estar sempre em alerta e prontos a reagir perante uma nova adversidade

E, como não podia deixar de ser, o auge de tudo isto é encontrado no final de cada um dos níveis, quando enfrentamos um general do exército de Garuda em intensas e brutalíssimas batalhas de boss. Se durante os níveis já temos de prestar atenção ao que os pequenos inimigos são capazes de fazer e planear com cuidado a nossa abordagem, nestes confrontos todas essas necessidades apresentam-se em esteroides. São encontros únicos e muitíssimo exigentes que testam a levam a nossa capacidade ao limite e que, em alguns momentos, nos levam a pôr em causa o nosso conhecimento das mecânicas do jogo. Mas nunca são muros intransponíveis, e a derrota de cada boss resulta quase sempre numa sensação de conquista bastante gratificante. E digo “quase” porque há apenas um confronto de boss que é uma chatice tremenda.

E já que toco no tópico da dificuldade, permitam-me apontar aqui a primeira falha desta experiência. Embora seja todo a favor de, e até procure bastantes experiências exigentes e que me desafiem de um ponto de vista da jogabilidade, também gosto de sentir que essa exigência vai aumentando gradualmente à medida que vou avançando. Infelizmente, em Shadow of the Ninja, esse aumento é tudo menos gradual – na verdade, é bastante irregular. Lembro-me bem de ter muitas dificuldades na primeira área de um nível, para depois limpar tranquilamente as restantes até ao boss final do mesmo. Lembro-me também de sentir todo um nível como brutalmente exigente e recear o que se seguia, apenas para voar pelo nível seguinte sem qualquer dificuldade. Há pontos altos e pontos baixos de dificuldade espalhados pelo jogo de forma algo irregular, o que perturba um pouco a experiência.


Voltando ao que Shadow of the Ninja faz de melhor - o design de níveis. Não para voltar a falar da diversão que a diversidade e colocação de inimigos confere à experiência, mas antes par ressalvar o quão divertido é explorar cada recanto de cada área. Sendo que controlamos ninjas, e com a amplitude de opções de navegação já referida, seria um pecado capital não aproveitar para desenhar níveis que tirassem partido desta mobilidade aumentada. Felizmente, cada nível onde Hayate e/ou Kaede são largados está repleta de áreas escondidas – algumas mesmo muito bem escondidas – cujas descobertas são sempre surpresas entusiasmantes. Entre itens de cura, power-ups ou utensílios únicos que podemos usar para atacar inimigos, somos sempre recompensados pela nossa curiosidade e por nos desviarmos do caminho para investigar um canto cuja sombra parece estranha, ou um teto que parece ser passível de ser atravessado.

Ah, e vamos finalmente falar dos utensílios, a vertente do jogo que mais ambiguidade me causa. Por um lado, são estes utensílios que oferecem à ação do jogo alguma variabilidade muitíssimo bem-vinda. Por outro, há itens que são absolutamente inúteis – maioritariamente por serem redundantes com os nossos ataques básicos, mas muitíssimo mais fracos -, enquanto que há outros que parecem ser demasiado poderosos. Poderosos ao ponto de limparem ecrãs cheios de inimigos sem termos de estar sequer a olhar para a nossa televisão ou monitor.

Apesar deste claro desequilíbrio no poder dos utensílios - que percebo que possa ser por design e que, até certo ponto, perdoo -, o que mais me incomoda nesta mecânica é o quão atrofiado é o processo de escolha dos mesmos. Temos de ficar a carregar no R1 (ou equivalente) e ir rodando qual o utensílio em destaque. E quando temos um utensílio assinalado, regressar à espada base requer voltar a carregar no R1 ou utilizar esse utensílio até o esgotarmos. Com tantos botões do comando por atribuir, e que, basicamente, não servem para nada, não entendo como não arranjaram uma maneira de rodar entre os utensílios e de regressar à arma base que fosse mais simples, mais intuitiva e, acima de tudo, menos frustrantes e menos passível de causar mortes irritantes.


Tratando-se este título de um remake de um clássico, claro que a primeira coisa que nos vai impressionar ou afastar é o aspeto do jogo. E, bem, não tenho absolutamente nada a apontar ao trabalho realizado neste campo. Shadow of the Ninja: Reborn é um jogo inacreditavelmente belo. A pixel art aqui presente é resplandecente! A utilização da cor é fenomenal, as animações são sublimes. E melhor do que tudo, retém todo o espírito do clássico. Olhando para imagens do original, dá para apontar exatamente o que inspirou cada cenário ou cada inimigo neste remake, e, acima de tudo, dá para perceber o respeito com o qual os produtores atuais reconstruíram toda esta experiência.

Quanto à banda sonora, confesso que não tive grande vontade de ir ouvir a original. Mas por um bom motivo. Porque a banda sonora aqui presente é de tal qualidade, que nem quis ir perceber se foi inspirada em trilhas sonoras do passado ou não. Para um jogo que me matou tantas vezes, e que me obrigou a reviver tantas vezes as mesmas notas musicais sempre que regressava à vida, mal posso acreditar que nunca me cansei de uma única música. Estava sempre a fazer curtas – e desajeitadas - danças à medida que ia avançando, morrendo e recomeçando, de tanto que gostei da música deste jogo.

Por fim, a performance do jogo já apresenta uma qualidade mais mista. Não me interpretem mal, nunca houve uma morte por causa de bugs ou glitches, e o jogo corria bastante bem. Mas Shadow of the Ninja: Reborn está repleto de erros ortográficos bizarros. Nos menus de escolha de utensílios a levar connosco no reiniciar da campanha, nos menus de explicação das mecânicas, e até na mensagem de morte, encontrei bastantes erros em palavras que, a meu ver, fazem parte de um vocabulário básico de um falante de inglês. Bem sei que posso parecer picuinhas para alguns, mas esta pequena pet peeve minha resulta num desconectar muito acentuado com a experiência. E infelizmente, isso aconteceu umas quantas vezes.


Conclusões
Shadow of the Ninja: Reborn é, sem sombra de dúvidas, uma experiência que merece toda a nossa atenção. Estamos perante um trabalho exemplar no que toca à modernização de um clássico com tantas décadas de existência. Os gráficos são vibrantes, enquanto retêm um toque clássico e a jogabilidade foi modernizada o suficiente para ser divertida, enquanto se mantém muitíssimo exigente. Há alguns problemas ou erros que marcam um pouco a experiência, mas o renascer desta experiência é de elevadíssima qualidade. É uma recomendação fácil, tanto para os mais nostálgicos como para quem nunca tinha posto os olhos no original.

O Melhor:
  • Jogabilidade é tão simples e cativante quanto é exigente
  • Níveis muito bem desenhados, cuja exploração é divertida
  • Direção artística em estilo pixelizado muitíssimo atraente
  • Banda sonora de qualidade e que fica no ouvido
  • Um ótimo trabalho de modernização enquanto retém o espírito clássico
 
O Pior:
  • Alguns picos de dificuldade inconsistentes e frustrante
  • Rodar entre utensílios é muitíssimo pouco prático
  • Erros ortográficos básicos nas poucas janelas de texto que surgem
 
Pontuação do GameForces – 8/10

Título: Shadow of the Ninja: Reborn
Desenvolvedoras: Tengo Project
Publicadora: Natsume Atari
Ano: 2024

Nota: Esta análise foi realizada com base na versão digital do jogo para a PlayStation 5, através de um código gentilmente cedido pela Tengo Project.

Autor da Análise: Filipe Castro Mesquita
Análise | Shadow of the Ninja: Reborn – Clássico com a Merecida Saída da Sombra Análise | Shadow of the Ninja: Reborn – Clássico com a Merecida Saída da Sombra Reviewed by Filipe Castro Mesquita on setembro 30, 2024 Rating: 5

Sem comentários:

Com tecnologia do Blogger.