Análise | Nintendo World Championships: NES Edition - Quem Corre Sem Gosto Pouco Avança

Eu podia abrir esta análise centrando-me nos Nintendo World Championships que batizaram este jogo, descrevendo um pouco estas competições que a Nintendo of America realizou ao longo das décadas, e destacando os seus desafios de pontuações máximas e recordes de tempo. Porém, o verdadeiro alcance da arte de speedrunning, de vencer videojogos no menor tempo possível, vai muito além do que a Nintendo pode açambarcar nas suas festas de pijama.

Seja demonstrando um nível de habilidade que faz picadinho de todos os obstáculos de um jogo ou explorando estratégias e glitches que permitem concluir uma aventura antes do fim do tutorial, é um deleite e um constante espanto descobrir o extremo a que os jogadores profissionais podem levar uma experiência. Assistindo uma qualquer speedrun, é imediatamente evidente a profundidade do estudo, planeamento e treino que a precederam, num trabalho disciplinado que é fascinante de compreender através de eventos como Games Done Quick e dos vídeos expositórios de Summoning Salt.

A dedicação hercúlea na base desta caça de recordes não está ao alcance de qualquer um e muito menos deste caríssimo redator, mas esta constatação não me privou do prazer que vem da otimização de tempo nos videojogos. Pikmin 3, Donkey Kong Country: Tropical Freeze, Hollow Knight e muito mais jogos possuem missões ou conquistas com limites de tempo exigentes, perfeitas para me fazer sentir como um estratega nato, um corredor imparável e, por brevíssimos momentos, um Deus dos videojogos.

Ora, Nintendo World Championships: Nintendo Entertainment System Edition é um título totalmente construído em torno de speedrunning. Dentro dele, encontramos 156 desafios, baseados em 13 jogos da NES:

  • Super Mario Bros.;
  • Super Mario Bros. 2;
  • Super Mario Bros. 3;
  • Super Mario Bros. The Lost Levels;
  • The Legend of Zelda;
  • Zelda II: The Adventure of Link;
  • Kirby’s Adventure;
  • Kid Icarus;
  • Metroid;
  • Donkey Kong;
  • Excitebike;
  • Ice Climber;
  • Balloon Fight.

Nestas missões, ver-se-ão a cumprir tarefas que vão do simples ao diabólico, como derrotar minibosses em Kirby’s Adventure, rebentar 15 balões em Balloon Fight, ou mesmo a jogar Super Mario Bros. do início ao fim. Após finalizarem a vossa incumbência, serão classificados de acordo com o vosso tempo.

Alcançar o Rank S em todas as missões é mais do que um apelo, é um vício. Quando iniciamos qualquer desafio, estamos apenas a aceitar uma prova aos nossos limites; quando nos estatelamos repetidamente contra o Rank A++, já estamos perante uma afronta às nossas habilidades, em que a nossa dignidade como jogadores está em causa! Isto porque, mesmo que existam diversas missões fáceis que dominamos na primeira tentativa, outras mantiveram-nos colados ao ecrã durante minutos ou, que a minha dignidade me perdoe, horas a tentar caçar cada significantemente insignificante milissegundo.

Horas em que o silêncio da nossa compenetração foi apenas interrompido pelos palavrões que sucedem cada erro, em que amaldiçoei cada byte por trás das físicas e hitboxes datadas de campanhas com mais de 30 anos. E interrompido pelas fungadelas alegres e convencidas do nariz quando limava 3 milissegundos de um recorde, antes de levar as mãos à cabeça porque tal não foi suficiente para abandonar esta breve penitência de Sísifo. E, antes de dar cabeçadas na Switch, lá conseguia o S, dava um murro triunfante no ar, e tudo ficava bem no mundo, no fim glorioso de um ciclo recompensante que me deixa surpreso com o imenso tempo de jogo, diversão e apoteose que é possível extrair de um pacote tão simples.

Simples não; simplícissimo. Não há floreados para levar o jogo além da sua premissa, não existe o usual twist Nintendo com que a empresa subverte os géneros em que se aventura. Se querem encontrar estes perlimpimpins, têm de regressar aos jogos NES Remix, que foram lançados antes de Nintendo World Championships, mas são paradoxalmente mais ambiciosos e mais baratos. NES Remix 1 e 2 também nos desafiavam com breves excertos de jogos da NES, e também nos classificavam com base nos nossos recordes de tempo. E este conjunto fazia-o pelo mesmo preço de Nintendo World Championships: NES Edition, mas esmagando-o tanto em quantidade mas em quantidade. Para além de ter mais do dobro dos níveis e de estes serem usualmente compostos por vários objetivos, ao contrário dos de Nintendo World Championships: NES Edition, quase 100 das missões eram desafios Remix que introduziam reviravoltas nos níveis clássicos - seja fazendo-nos resgatar Pauline de Donkey Kong na pele de Link, ou vencer um puzzle de Wario’s Woods com o ecrã espelhado verticalmente.

Fora o preço desajustado para o conteúdo em oferta, não há nada propriamente errado com este foco na premissa basilar, especialmente numa freneticamente divertida como esta. Apenas gostava de ter visto a Nintendo a ir um pouco mais longe com este conceito. Os modos extra online, em que competimos contra os fantasmas dos outros jogadores nos mesmos desafios do jogo base e sem interação entre participantes, apenas acrescentam à experiência a possibilidade de vermos a performance dos outros jogadores e em nada expandem o replay value ou são um bom substituto para os leaderboards omissos. E o modo de festa local, em que até oito pessoas correm em simultâneo na mesma consola, pode ser euforizante com as suas rivalidades encharcadas de adrenalina, os olhares furtivos à posição dos nossos amigos, e as gargalhadas sempre que alguém morre repetidamente no mesmo sítio, nomeadamente nos desafios mais longos, mas em nada é alterada esta falta de interação entre participantes ou de missões especiais.

Se a Nintendo tinha em mente dar-nos uma experiência competitiva pura, podia ter abraçado essa ideia com mais entusiasmo. Poderiam ter incluído guias minuciosos sobre as físicas, controlos, glitches e estratégias para cada jogo, em vez dos efetivos guias que acompanham o desafio final de cada clássico NES e que se relegam à explicação de mecânicas que já treinamos nas missões anteriores ou à enunciação das rotas que somos obrigados a tomar. Os replays que ilustram cada missão são anedóticos, com a sua lentidão a invalidar o seu propósito exemplificativo. Embora a interface seja adequadamente aligeirada, a contagem decrescente (3...2...1...) antes de cada desafio poderia ser mais célere, ao estilo dos níveis cronometrados de Rayman Legends, em vez de durar mais do que imensos dos desafios. E não entendo por que motivo a Nintendo não retocou aspetos que melhorariam estes clássicos sem prejuízo da habilidade por eles exigida, como as atrozes quedas da taxa de fotogramas em Kirby’s Adventure.

De igual forma, é incompreensível, numa homenagem aos históricos campeonatos da Nintendo, que nem sequer existam missões similarmente orientadas para o atingimento de pontuações máximas, e que nem tenham importado os desafios especiais que constaram da edição de 1990 do evento. Adicionalmente, poderia ter sido incluído um livro digital ou um documentário que expusesse estes torneios, ou mesmo um arquivo mais ambicioso que resgatasse momentos-chave da história de speedruns. Residia neste lançamento a oportunidade da Nintendo de abraçar a comunidade de speedrun e escancarar a porta para uma nova cultura aos seus consumidores, completamente ignorada neste produto final ensimesmado e com visão túnel.




Conclusão
Nintendo World Championships: NES Edition faz exatamente aquilo a que se propõe: dar ao jogador comum um gostinho do que é speedrunning, e proporcionar-lhe um sentimento de conquista e de maestria sobre clássicos da NES.

Não faz é muito mais, denotando comodismo nos modos extra supérfluos, na recusa em reformar os 13 clássicos que inclui, e no desinteresse em celebrar a cultura de speedruns ou sequer os campeonatos que batizaram o jogo. Este é um retrocesso face aos NES Remix que holisticamente transparece ambições humildes, não refletidas no preço de uma proposta que bem poderia ser um bónus no serviço Nintendo Switch Online.

O melhor
- Desafios prazerosos e variados baseados em 13 jogos da NES...
- ...que capturam a montanha russa de emoções de speedrun;
- Modo de festa positivamente recheado de adrenalina e rivalidade;
- Menus rápidos que facilitam a repetição dos desafios...

O pior
- ... ao contrário da lenta contagem decrescente que inicia cada tentativa;
- Sem nenhuma surpresa ou ajuste nos jogos incluídos;
- Modos online supérfluos;
- Com valor diminuto enquanto celebração de speedruns ou dos Nintendo World Championships.

Nota do GameForces: 7.0

Título: Nintendo World Championships: NES Edition
Desenvolvedora: Nintendo EPD; indieszero
Publicadora: Nintendo
Ano: 2024

Nota: Esta análise foi realizada com base na versão digital do jogo para a Nintendo Switch, através de um código gentilmente cedido pela Nintendo Portugal.

Autor da Análise: Tiago Sá
Análise | Nintendo World Championships: NES Edition - Quem Corre Sem Gosto Pouco Avança Análise | Nintendo World Championships: NES Edition - Quem Corre Sem Gosto Pouco Avança Reviewed by Tiago Sá on julho 30, 2024 Rating: 5

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