Análise | Sonic Superstars – Velocidade Furiosamente Frustrante


Normalmente, eu começaria uma análise de um jogo com algumas curiosidades sobre a série ou o género em que se insere, com um cunho pessoal que alude ao meu historial com títulos anteriores ou relacionados. Desta vez, não vou dourar a pílula. Sonic Superstars é um jogo mau, a roçar o péssimo. Eu adoro os jogos Sonic the Hedgehog (basta verem todos os jogos que já analisei aqui, aqui, e aqui, e até a crítica do segundo filme que escrevi) e, mesmo num ano tão recheado de qualidade – e mesmo com o lançamento na mesma semana de Super Mario Bros. Wonder e Marvel’s Spider-Man 2 – foi com enorme entusiasmo que comecei este jogo. Mas muito rapidamente isso se esmoreceu, e tive de me confrontar com uma dura realidade - eu detesto Sonic Superstars com tudo o que tenho.

Foi a primeira vez que um jogo do ouriço-cacheiro azul me fez querer gritar de frustração. Foi a primeira vez que um jogo Sonic me fez querer desistir de o jogar. Foi a primeira vez que um jogo me deu genuína vontade de partir o comando desde os meus 15 ou 16 anos. É o primeiro jogo que me está a fazer sentir irritado só de estar a escrever sobre ele. Irritado e triste, porque a verdade é que Sonic Superstars tinha tanto, mas tanto potencial que é inevitável sentir-me triste pelo falhanço tremendo em realizá-lo.


Vamos por partes, e começar por um dos aspetos menos negativos de Sonic Superstars: a sua história. O génio malvado Eggman voltou à ação e planeia usar todo o seu engenho para conquistar uma nova região chamada Northstar Islands. Para além das suas invenções destrutivas e das ameaças metálicas que constituem o seu exército, Eggman contratou Fang e a sua ajudante Trip para ajudar na sua demanda de conquista. E é aqui que entramos em ação, tendo de ajudar Sonic, Tails, Knuckles, Amy e, eventualmente, uma nova personagem a pôr um fim aos planos maléficos do sempre mal-intencionado Eggman.

Para tal, teremos de ajudar uma ou várias destas personagens a atravessar níveis em 2.5D, correndo, saltando, voando e abatendo criaturas robóticas enquanto, pelo caminho, recolhemos Chaos Emeralds e ajudamos a salvar uma data de animais que o grupo de vilões anda a raptar. Portanto, nada de propriamente inovador para a série, sobretudo quando se apresenta como um side-scroller de plataformas. A história é simples e inofensiva, os níveis apresentam-se sempre muito bonitos e com detalhes ambientais de grande qualidade, e até a estrutura de zonas e actos é bem-vinda, já que permite usar cenários bastante variados – ainda que pouco inovadores.

Até a jogabilidade é inofensiva. Diria que é maioritariamente boa, até. Mas apenas quando o design dos níveis não deita tudo a perder. Sonic Superstars apresenta alguns dos piores designs de níveis de que tenho memória em todos os meus 25 anos de fã de videojogos. Se tivesse de resumir o que penso dos designs de níveis deste jogo, diria algo do género: se algum dia houver uma espécie de “Sonic Maker,” onde os jogadores podem criar e partilhar níveis de Sonic the Hedgehog, terão aqui um template de como criar alguns dos níveis mais frustrantes, irritantes e aberrantes possíveis.


Vamos então falar do design de níveis deste jogo – e prometo tentar não tornar os parágrafos seguintes meras checklists de problemas. De facto, para tal, creio que é útil agrupar os inúmeros e tão variados problemas que fui apontando ao longo das minhas 10 horas de experiência com Sonic Superstars em três grandes temas: colocação de perigos, falta de controlo e questões de visibilidade/tempo de reação.

A colocação de perigos (de inimigos, de armadilhas, de plataformas e de outros elementos ambientais) é uma peça fundamental do design de qualquer jogo deste género. Um jogo de plataformas em 2D vive e morre pela minúcia e pela inteligência com que os ambientes são recheados. E, portanto, é muitíssimo grave que esta seja uma das maiores fontes de frustração, irritação e desespero deste jogo.

Perdi conta à quantidade de vezes que inimigos foram colocados ou alinhados numa posição em que a minha passagem se tornou virtualmente impossível sem sofrer dano, em que os inimigos se tornam quase invulneráveis. Perdi conta a quantas vezes me deparei com “power-ups” que motivam a abraçar a veia velocista de Sonic, para ser imediatamente travado por inimigos ou armadilhas que se encontram mesmo ao virar da esquina. E perdi a conta à quantidade de saltos de fé que o jogo me pediu para (e obrigou a) fazer para apenas me recompensar com abismos, filas de espigões ou inimigos invulneráveis a ataques vindos de cima.

Nada disto é remotamente divertido. Bem pelo contrário, reflete uma filosofia de design arcaica, estagnada e que nada aprendeu com as dezenas de jogos desta série e deste género que andam a ser lançados desde os anos 80. É incrivelmente enervante avançar pelos níveis e saber que, a qualquer momento, o jogo me pode pregar uma partida e matar de repente sem que eu possa fazer nada – a não ser que já tenha caído na esparrela antes.


Por falar em não poder fazer nada para evitar pisar um ancinho e levar com o cabo na cara, falemos da falta de controlo que Sonic Superstars proporciona. Essas armadilhas virtualmente inevitáveis são situações quase completamente fora do nosso controlo, mas à terceira ou à décima vez que passamos por elas conseguimos dar-lhes a volta. Já inacreditavelmente frustrados, e um bocado mais carecas, mas acaba por ser possível. Quando falo de falta de controlo, refiro-me a problemas aos quais não temos maneira de dar a volta, dê lá por onde der – e Sonic Superstars comete este pecado de forma clamorosa.

Seria de esperar que num jogo chamado Sonic a velocidade fosse algo obrigatório por lei. Na verdade, parece ser, mas apenas aplicado a tudo o que não seja uma personagem jogável.  Não tenho memória de um jogo deste franchise onde Sonic e companhia demorem tanto tempo a mexer-se, a ganhar balanço ou a manobrarem-se em geral, tanto no ar como no chão. Todos os movimentos são tão lentos, pesados e morosos que se torna inevitável sermos esmagados por colunas descendentes ou no fogo cruzado de fileiras de inimigos. E neste aspeto, Tails e Knuckles são particularmente frustrantes, já que parecem precisar de respirar uns bons 2 segundos depois dos seus voos pelo ar, ficando sem reagir a qualquer input durante esse tempo depois de aterrarem em terra firme.

E os bugs? Claro que não seria um Sonic sem bugs inacreditavelmente frustrantes, e todos os que experimentei aqui contribuem para esta falta de controlo. Desde ser esmagado por objetos invisíveis, a sofrer dano de ataques cujas animações já haviam terminado e, portanto, sem qualquer indicação de perigo no ecrã, a caixas de contacto visualmente incoerentes, há aqui um pouco de tudo o que poderia ser frustrante num jogo de plataformas. Fiquei a dever umas duas dezenas de mortes, e de novos cabelos brancos, aos bugs deste jogo.


Por fim, vamos às questões de reação e de visibilidade, o culminar de vários dos problemas anteriores e, como verão mais abaixo, uma explicação para os mesmos também. Como podem perceber por esta designação, Sonic Superstars também é culpado de outro crime grave no que toca a “game design”: não nos dá tempo para registar e reagir ao que está a acontecer no ecrã. Há diversos inimigos que nos atacam assim que aparecem no ecrã, ataques que apresentam velocidades sobre-humanas, ou armadilhas que surgem no nosso caminho tão repentinamente que nem um atleta olímpico conseguiria esquivar-se.

E eis que chego ao cerne da questão, ao fator diferenciador que torna esta experiência tão inacreditavelmente enfurecedora e frustrante: a câmara. A câmara deste jogo está demasiado próxima da ação, demasiado em cima da personagem com que jogamos, que se encontra sempre alinhada ao centro do nosso ecrã. Ou seja, vemos sempre muito pouco do que está à nossa frente ou atrás de nós. Isto torna o correr e voar pelos níveis um exercício de masoquismo, torna impossível ter tempo de reação suficiente quando algo surge no nosso caminho a velocidades superiores às de lesmas. Se descontarmos os bugs e a péssima colocação de inimigos, é O fator que agrava quase todos os problemas que fui referindo, e que torna Sonic Superstars um dos piores jogos de toda a série e, sem dúvidas, um dos piores jogos do ano.

O mais lamentável destes problemas com a câmara é que há dois momentos em que Sonic Superstars mostra que até sabe o que é uma boa colocação de câmara para este género de jogos. Uma é durante os créditos finais, onde a personagem jogável é encostada à esquerda, dando-nos mais do que tempo suficiente para reagir a tudo o que aí acontece. Outra é durante o jogo em cooperação. Sim, durante a maioria da campanha dá para jogar em conjunto com até outros três jogadores, e aí a câmara afasta-se o suficiente para tornar a experiência bastante mais tolerável. Não boa, já que os bugs e outras vertentes do design continuam a ser frustrantemente problemáticas, mas muitíssimo menos frustrante. Honestamente, e caso tenham MESMO de jogar Sonic Superstars e o queiram fazer a solo, recomendo que façam o seguinte: liguem um segundo comando, e joguem deixando a segunda personagem para trás.


É uma pena haver tantos e tão graves problemas com esta experiência, ao ponto de ter de arranjar estratagemas para conseguir retirar algum prazer do que Sonic Superstars oferece. É uma pena porque há aqui ideias genuinamente boas e interessantes. A direção artística é muitíssimo bela, com os ambientes bastante detalhados, variados e cheios de cor e de vida. As Chaos Emeralds desempenham um papel mais determinante, já que em conjunto voltam a permitir uma super transformação, mas individualmente cada uma confere habilidades diferentes que tornam a exploração dos níveis mais interessante. E os níveis em si apresentam-se mais amplos do que nunca, com mais cantos e recantos por explorar e segredos por descobrir, tirando bem partido da sua tridimensionalidade para experimentar com uma ou outra ideia inovadora.

Mas até aqui, quando estou a elogiar algo, tenho de mencionar uma parede contra a qual o jogo volta a esbarrar. Porque se a existência de níveis mais amplos e com mais segredos pode ser uma coisa boa, é bastante desapontante quando percebemos que esses segredos não são nada bons. Para além do ocasional power-up bem escondido, que é genuinamente giro de descobrir, os níveis estão repletos de portais para níveis bónus. E aqui há dois problemas: os portais são tantos que, também eles, acabam por quebrar demasiado o ritmo dos níveis “a sério,” e esses níveis bónus são aborrecidíssimos.

Ou seja, em geral prolongam artificialmente uma experiência que, por si só, já não é nada boa, quebrando-lhe ainda mais o ritmo com algo que é quase espantosamente pouco divertido. Se ao menos as recompensas fossem boas, poderia olhar para estas constantes interrupções com outros olhos, mas depois de colecionadas todas as Chaos Emeralds não há mesmo motivo nenhum para participar nesta vertente do jogo. As recompensas são sempre medalhões dourados que podemos gastar numa loja do jogo para comprar peças de equipamento. Não para Sonic e companhia, mas antes para um pequeno robô que enfrentamos numa das batalhas boss da história e com o qual jogamos no modo de batalha. Que também é inacreditavelmente entediante. Ficarei genuinamente surpreendido se alguém jogar este modo mais do que uma vez, portanto é uma pura perda de tempo continuar a tentar passar todos os níveis bónus da campanha.


Por falar em batalhas boss, esqueçam a possibilidade de estas serem algo redentor de Sonic Superstars. Bem pelo contrário, são o apogeu de tudo o que de errado este jogo tem para oferecer. Lembram-se dos bosses dos jogos originais de Sonic the Hedgehog, nos quais podíamos destruir a maioria dos bosses em segundos se dominássemos as mecânicas e fôssemos engenhosos o suficiente para criar um ritmo de ataques rápidos aos seus pontos fracos? Esqueçam isso. Aqui, só podemos danificar os bosses em momentos muito específicos das batalhas, quando o jogo nos deixa. Não interessa se arranjamos maneira de chegar aos pontos fracos, se os atacarmos fora do timing suposto, ou somos danificados ou repelidos – muitas vezes contra armadilhas ou buracos sem fundo.

Mas não é só isso. É durante as batalhas contra bosses que todos os defeitos do jogo se acentuam e exponenciam. O tamanho dos bosses faz com que, geralmente, o espaço para manobras seja curtíssimo, tornando a falta de mobilidade ágil e a proximidade da câmara ainda mais problemáticas. Há imensos bugs que nos deixam presos algures nas estruturas gigantescas dos bosses, matando-nos passados momentos. E é nos bosses que encontramos alguns dos ataques mais supersónicos de que tenho memória, tornando a esquiva impossivelmente apertada. Lembro-me bem de um boss com ataques rapidíssimos que destruíam o chão em que corremos durante a luta, e era genuinamente uma lotaria: se calhasse apontar para onde estamos (e não dá para antever para onde a mira está dirigida) era morte certa, e boa sorte para a próxima.

Para terminar, quero só reforçar o quão penoso foi escrever estas palavras sobre o novo jogo de uma das minhas séries preferidas. Eu adoro Sonic, e não retiro qualquer prazer em criticar tão duramente um título desta mascote. Mas não há como fugir: este é um dos piores jogos de todo o franchise, e um dos únicos aos quais certamente nunca regressarei – nem para conseguir a platina facílima estou disposto a fazê-lo. A minha desilusão com este jogo apenas é suplantada pelo alívio que sinto ao finalmente poder dá-lo por terminado e poder desinstalá-lo da minha consola. E acreditem quando vos digo que nunca mais quero sentir isto com nenhum jogo, muito menos com um Sonic the Hedgehog.


Conclusões
Sonic Superstars não é uma boa experiência, nem uma experiência que eu possa recomendar minimamente a qualquer jogador, independentemente do quão fãs são desta icónica mascote. Os níveis são tão mal desenhados que quase toda a experiência se torna frustrante ao ponto de querer arrancar os cabelos – sobretudo as batalhas contra bosses. Apenas a direção artística e uma ideia ou outra impedem este jogo de ser um falhanço completo, mas não previnem que seja um dos piores jogos de sempre da série Sonic the Hedgehog e uma das maiores desilusões do ano.
 
O Melhor:
  • Direção artística colorida e vibrante, que usa bem ambientes em 2.5D
  • Níveis amplos e repletos de segredos para descobrir
  • Poderes das Chaos Emeralds acrescentam algum prazer à exploração dos níveis

O Pior:
  • É um dos jogos com pior design de níveis deste século
  • Demasiados níveis bónus aborrecidos que travam o ritmo dos níveis principais
  • Colocação desmiolada de inimigos gera enorme frustração
  • Batalhas boss são algumas das piores de toda a série
  • Lentidão na manobra das personagens causa demasiadas mortes
  • Repleto de bugs que levam a mortes impossíveis de escapar
  • Posicionamento da câmara é terrível e um dos principais motivos de tantos destes problemas

Pontuação do GameForces – 3.5/10

Título: Sonic Superstars
Desenvolvedoras: Arzest, Sonic Team
Publicadora: SEGA
Ano: 2023

Nota: Esta análise foi realizada com base na versão digital do jogo para a PlayStation 5, através de um código gentilmente cedido pela Ecoplay.

Autor da Análise: Filipe Castro Mesquita
Análise | Sonic Superstars – Velocidade Furiosamente Frustrante Análise | Sonic Superstars – Velocidade Furiosamente Frustrante Reviewed by Filipe Castro Mesquita on novembro 14, 2023 Rating: 5

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