Análise | EA Sports FC 24 – Nova Era Começa com Uma Falta Feia


Há três coisas garantidas nesta vida: a morte, os impostos, e um novo FI… ah, um novo simulador do mais apaixonante desporto do mundo da EA Sports. Depois de se separar da organização que gere todo o futebol, FIFA 23 foi o último jogo de seu nome. Agora, para a temporada 2023/24 temos… EA Sports FC 24. Não, não é um bom título, mas depois das mudanças positivas da entrada do ano passado, espero que esta seja a pior das diferenças no simulador que andaremos a jogar nos próximos 12 meses. Conseguirá EA Sports FC 24 capturar a magia do futebol, ou será que esta nova pintura significa que toda a experiência sai borrada?


É bastante comum encontrarmos por aí a mesma piada de copy/paste associada aos simuladores de futebol da EA Sports nesta altura do ano. Se no ano passado argumentei que o jogo teve uma evolução bastante positiva, este ano é bem mais difícil dizer o mesmo. A boa notícia, é que essas piadas de copy/paste não poderão ser feitas. A má notícia é que a piada a fazer este ano será a do “deixa-me copiar o teu trabalho de casa, mas pior para não dar nas vistas.”

Começando pelo aspeto do jogo, não dá para não reparar no quão diferentes os menus estão. E se estão a aplicar a analogia/piada anterior não terão dificuldades em adivinhar que essas diferenças são para pior. A interface de utilizador é banal, insípida e simplesmente feia, parece que estou a interagir com menus de um website desenhado numa tarde. Mas isto não significa que seja mais simples interagir com estes menus. Logo a abrir, as definições são de alcance muito pouco intuitivo, e os modos de jogo aparecem por uma ordem estranha. Felizmente, este menu vai-se ordenando consoante os modos que mais jogamos, mas não deixei de estranhar, por exemplo, o modo Kick Off (o que todos mais jogaremos com amigos, provavelmente) ou a opção de “Aprender a Jogar” começarem enterrados depois dos modos de torneios ou outros certamente muito menos populares.

De resto, EA Sports FC 24 apresenta uma qualidade gráfica elevada, mas algo inconsistente. Continua a haver uma grande discrepância entre o detalhe visual entre os melhores jogadores de cada liga – por exemplo, Pedro Gonçalves ou Rafa apresentam-se muito mais realistas do que Alisson Safira ou Fábio Ronaldo. Mas mesmo estes jogadores de grandes clubes portugueses se encontram muito menos detalhados do que alguns dos melhores do mundo, como Haaland ou Salah. Continua a haver três categorias de jogadores para a EA Sports (os melhores, os de clubes internacionalmente relevantes, e os outros), e lamentavelmente, neste aspeto, a mudança de nome do jogo não trouxe uma mudança de atitude por parte dos produtores.


E esta categorização sente-se ainda durante o jogo em si, em dois pormenores que reparei durante as duas experiências que tive no modo de carreira. Primeiro, é que os contadores e os mostradores de ligas consideradas secundárias receberam muitíssimo menos atenção do que os das ligas top-5. Sim, voltei a começar um modo de carreira com o meu Sporting, apenas para me sentir imediatamente desmotivado passadas duas ou três sessões de jogo. Mais uma vez, a interface de utilizador voltou a ser básica e desinspirada e, pior do que isso, o trabalho colocado para distinguir ambas as equipas que entravam em campo foi muito mau. Não interessa contra quem jogava e qual dos três equipamentos escolhia, parecia sempre que as camisolas dos meus jogadores se confundiam com as dos meus adversários. Como raio é que a camisola principal deste ano, que tem muito mais verde que a do ano passado, se confunde com a do Vitória de Guimarães, que é totalmente branca?

Mas pior do que ter todos os equipamentos tão pouco detalhados ao ponto de se confundir quase todos uns com os outros, foi a sensação de jogo em si. Os meus jogadores comportavam-se todos de forma igual. Estar a atacar com Gyökeres ou com Daniel Bragança, ou estar a defender com Gonçalo Inácio ou com Trincão era quase a mesma coisa. Não há nuances, as estatísticas parecem ter pouquíssima influência no que depois sentimos em campo. Era quase como se os meus jogadores apenas diferissem no seu aspeto físico e no número da camisola, e sentia o mesmo em relação aos adversários contra quem jogava. E não entendia porquê.

Até que depois decidi brincar na areia e começar uma carreira com o Manchester City e injetar o máximo de dinheiro possível no clube, para criar a melhor equipa de sempre. E eis que começava a jogar um EA Sports FC 24 completamente diferente. Os jogadores mexiam-se, rematavam e lutavam pela bola de modos distintos uns dos outros. Os menus e os indicadores de jogo eram coloridos e apresentavam muito mais vida. Jogar com Bernardo Silva ou com Bruno Fernandes era completamente diferente. Não tinha nada a ver com a experiência aborrecida e enfadonha do modo de carreira na liga portuguesa. Na liga inglesa, estava a divertir-me à brava.


Foi então que entendi: a maioria dos jogadores tinha, pelo menos, um atributo de ouro. Este sistema de atributos já existia nos jogos FIFA há muito tempo, mas costumavam significar que os jogadores tinham um remate ligeiramente mais potente ou que os seus passes eram um pouco mais precisos. Já não é o caso. A grande maioria dos jogadores agora tem atributos prateados, imensos deles repetidos em quase todos os atletas, e a diferença para o efeito que um atributo de ouro confere parece ser muito maior. Isto faz com que quase todos os jogadores sem atributos de ouro se assemelhem imenso no modo de jogar (é quase indiferente ter Morita ou Mateus Fernandes em campo), e, por outro lado, faz com que os jogadores com atributos de ouro sejam os únicos cuja utilização é distinta e divertida (ter Vinícius Jr. é muito mais divertido do que Rodrygo). A existência de filhos e enteados para a EA Sports é agora mais clara do que nunca, ao ponto de estar a acontecer algo de inédito nos meus 20 anos de experiência de jogo dos simuladores de futebol da EA Sports: não tenho a mínima vontade de fazer modos de carreira na liga portuguesa.

Apesar destas discrepâncias entre os melhores jogadores do mundo e os restantes (mesmo os que se encontram imediatamente abaixo desse estatuto), EA Sports FC 24 continua a ser um jogo divertido e o melhor simulador deste lindíssimo desporto. Brincar com disposições táticas diferentes continua a entreter bastante, os sistemas de remates, de passes e de bolas paradas continuam a ser de elevadíssima qualidade. E as novas indicações estatísticas em tempo real complementam muito bem as que já existiam, e continuam a dar imensa vida ao jogo. 

O único aspeto do “jogo jogado” que se apresenta notoriamente pior é o sistema de faltas. Qualquer toque no botão de desarme ou de carrinho que não resulte exclusivamente em contacto com a bola dá falta. Por outro lado, se eu levar Rúben Dias a correr contra a bola ou contra o jogador adversário que tem a sua posse sem clicar em nada e ganhar no físico, nunca é falta. Isto resulta em mecânicas de defesa pouco intuitivas e caóticas, e em cenários ridículos de jogadores a serem completamente abalroados sem que a bola seja tida nem achada, mas como não se carregou num botão de desarme, segue jogo.


Como já acontecia com estes jogos quando tinham outro nome, EA Sports FC 24 oferece-nos uma quantidade e variedade enorme de modos de jogo nos quais podemos simular jogar o desporto-rei. E claro, terei de começar pelo modo que mais horas de consome todos os anos, o modo de carreira. Mas permitam-me um curto desabafo: continuarem a inspirar-se em Football Manager não é uma boa ideia. Se todos louvámos a introdução de mecânicas de desenvolvimento personalizadas ou a possibilidade de mudar a posição de um jogador neste modo, agora a EA Sports levou as coisas um pouco longe demais com as três principais mudanças deste ano.

A introdução de estratégias de equipa não parece impactar em nada o modo como a o nosso 11 se comporta em campo. A contratação de staff de treino é uma chatice, porque nunca dá para contratar em número ou qualidade o suficiente de modo a potenciar ao máximo o desenvolvimento dos nossos jogadores. E os planos de treino também não produzem efeitos visíveis, para além da enxurrada de e-mails a dizer-me para estar constantemente a trocar de plano para este jogador e aquele. Estas são as três mudanças neste modo face ao jogo do ano passado, e são todas más: a primeira é inócua, a segunda piora uma vertente deste modo que era bastante divertida, e a terceira é só irritante pelo spam de mensagens que causa. Salva-se uma quarta mudança, que consiste na introdução de novas cenas cinemáticas durante o intervalo (vendo os jogadores regressar ao balneário e receber indicações) e as cenas cinemáticas de cerimónias de prémios, onde vemos jogadores ou treinadores da nossa equipa a participar em entregas de prémios. Adições que acrescentam pouco, sim, mas que são giras.

Felizmente, parece que alguns dos maiores bugs e problemas do modo de carreira do ano passado não estão presentes este ano, mas isso não significa que esteja tudo resolvido. As conferências de imprensa antes e depois das partidas continuam repetitivas e cheias de perguntas e respostas que não fazem sentido. Há vários comentários que não fazem sentido, como um hilariante que me dava as boas-vindas à final da Champions no início do primeiro jogo da fase de grupos contra o Radomiak Radom. Continua a haver transferências que acontecem em todos os modos de carreira, sem falta. E claro, os ocasionais bugs gráficos ou textos de placeholder que surgem aleatoriamente. Mas pelo menos, o jogo parece não correr o risco de bloquear nas transições entre as sequências de negociação de transferências e os menus do modo de carreira, como acontecia no ano passado tantas vezes.


Passando rapidamente por alguns dos outros modos, o modo VOLTA continua essencialmente o mesmo. Apresenta uma boa variedade de jogos mais rápidos e curtos que se aproximam do que era FIFA Street (mas nunca capturando aquela magia), e um sistema de criação e personalização do nosso jogador profundo. No entanto, fico com a impressão que este modo também piorou face ao ano passado em dois aspetos: a nova interface torna mais difícil distinguir quem são os elementos da nossa equipa, e a aposta em microtransações parece ser mais agressiva do que antes – são precisos imensos créditos para comprar itens de personalização, e os que ganhamos a jogar casualmente nunca são em número suficiente para ir fazendo compras a um ritmo gratificante.

Também foi neste modo que encontrei os únicos problemas técnicos do jogo. Não consegui jogar uma única partida online, dando erro sempre que tentei. E mesmo o modo offline funcionou bastante mal, bloqueando-me o jogo mais do que uma vez. Como se isso não bastasse, o jogo registou-me como tendo entrado e desistido do jogo, resultando em várias derrotas por 3-0 inevitáveis. O modo VOLTA já não era uma vertente onde investisse muito tempo, e depois do que vi aqui, assim continuará.

Felizmente, o modo Ulitmate Team não sofre dos mesmos problemas de acesso às partidas, tendo eu experimentado vários tipos de jogo online e offline que funcionaram sempre sem problema. Mas sofre também de problemas de microtransações excessivas e agressivas – que continuam a tornar este um modo pay-to-win, convém referir -, e é incrivelmente penalizado pela nova interface de utilizador que torna os menus demasiado confusos. Antes de descobrir como raio podia jogar uma partida normal de Divisões online, devo ter perdido uns bons 10 minutos a navegar o pior sistema de menus de que tenho memória num videojogo.


Mas é também no Ultimate Team que encontramos a melhor novidade, se não mesmo a única adição verdadeiramente positiva de EA Sports FC 24: a inclusão de jogadoras de futebol feminino. Sim, a partir deste ano passa a ser possível calhar-nos jogadoras nos pacotes de cartas virtuais e criar equipas que misturam atletas masculinos e femininas no mesmo 11. Para além de dar aos jogadores que adoram este modo um leque ainda maior de atletas para experimentar quando estiverem a montar as suas equipas, este é um passo em frente enorme e bastante louvável por parte da EA Sports na promoção do futebol feminino.

Mas esta promoção não se fica por aqui, havendo mais modos de jogo para equipas de futebol feminino e ainda mais clubes e jogadoras presentes no jogo. E sim, os adeptos e as adeptas portuguesas podem orgulhar-se de ter um clube luso no elenco de novas equipas, uma vez que a equipa feminina do Benfica pode ser escolhida para disputar diversos troféus, incluindo a Champions League. E é possível levar Kika Nazareth e companhia a levantar o troféu da maior competição de clubes enquanto apreciamos contadores e grafismos oficiais que podemos ver na televisão na vida real.

Nota-se que muita mais atenção foi dada aos modos de futebol feminino, e há que elogiar esse trabalho. Agora quero que incluam um modo de carreira mais completo, com transferências malucas e sistemas de academias e desenvolvimento de jogadoras jovens. E adicionem o Sporting, de modo que eu não tenha de usar o Arsenal na Champions League feminina do próximo jogo.


Conclusões
Não vos vou mentir, EA Sports FC 24 tem sido algo desapontante até agora. As mudanças não são assim tão grandes face ao ano passado, mas há modos a funcionar pior, novidades que irritam mais do que divertem, erros com anos de existência que continuam a não ser resolvidos e uma nova interface de utilizador feia e confusa. Nem tudo é mau, já que, se descontarmos o sistema de faltas, a jogabilidade continua a ser divertida e a melhor do mercado. Portanto, se os simuladores da EA Sports já vos cativavam antes, este também cativará. Se não, ou se estão fatigados da fórmula, então é provável que façam como eu e não esperem pelo apito final para sair do estádio.

O Melhor:
  • Jogabilidade base continua a ser bastante divertida
  • Novas estatísticas interativas em tempo real são muito boas
  • Miríade de modos de jogo e de formas de personalizar partidas com amigos
  • Inclusão de atletas das ligas femininas no Ultimate Team
O Pior:
  • Interface e menus feios e até confusos
  • Grande discrepância entre jogadores com e sem atributos de ouro
  • Modo de carreira com problemas do passado e novidades irritantes
  • Modo VOLTA cheio de erros no acesso às partidas
  • Sistema de faltas incompreensível

Pontuação do GameForces – 6/10

Título: EA Sports FC 24
Desenvolvedora: EA Sports
Publicadora: EA
Ano: 2023

Nota: Esta análise foi realizada com base na versão digital do jogo para a PlayStation 5, através de um código gentilmente cedido pela EA.

Autor da Análise: Filipe Castro Mesquita
Análise | EA Sports FC 24 – Nova Era Começa com Uma Falta Feia Análise | EA Sports FC 24 – Nova Era Começa com Uma Falta Feia Reviewed by Filipe Castro Mesquita on outubro 05, 2023 Rating: 5

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