O tempo é e sempre será uma variável
importante nos jogos. Servindo por exemplo como uma restrição para nos obrigar a concretizar desafios com maior maestria ou como uma forma de gradação
do nosso desempenho, efetivamente em inúmeros títulos o tempo é uma crucial condicionante do modo como os abordamos e apreciamos. No entanto em alguns gêneros como os jogos
por turnos, a relação com o tempo real não é tão frequente ou direta, por fatores como a codificação do tempo
em ações ou turnos. É aqui que entra RESEARCH and DESTROY, que em
contraste com as normais propostas do gênero coloca o tempo real no centro da
jogabilidade.
Antes de mais, RESEARCH and DESTROY posiciona-nos na pele de três cientistas, Larry, Gary e Marie, que devem usar as suas armas e gadgets para recuperar a Terra após os humanos serem quase extintos e em consequência o planeta ser tomado por hordas de criaturas supernaturais, como zombies, vampiros e lobisomens. Se esta premissa poderia sugerir uma aventura marcada por terror e sobriedade, RESEARCH and DESTROY adota a abordagem diametralmente oposta. Com grafismo cartunesco, diálogos levianos e humorísticos (e escassos) e uma história resumida ao pano de fundo que já descrevemos, o tom deste título é leve e reminiscente das séries de animação que víamos ao sábado de manhã.
Com o minúsculo foco dado à história, pouco nos distrai da jogabilidade desta aventura. Como já devem ter concluído pela introdução, este é um jogo por turnos, com vários pontos de encontro com RPGs táticos: em cada ronda, orientamos os três cientistas, e no final do turno é a vez dos monstros supernaturais se moverem e atacarem. Na pele dos protagonistas, podemos realizar variadas ações, que vão desde o nosso movimento inato (caminhar, saltar, disparar e ressuscitar os colegas) até ações específicas de cada arma. O que é que condiciona as ações que podemos tomar? O tempo! Cada herói dispõe de um tempo em segundos predefinido para atuar na sua ronda. Se estivermos parados ou apenas a mover a câmara, não consumiremos tempo, mas quando realizamos alguma ação como andar ou apontar a arma os segundos (ou frações de segundo) que despendemos na mesma serão descontados. Não temos de gastar todo o tempo de uma personagem de uma vez: a qualquer momento podemos trocar entre os protagonistas, possibilitando assim que sejamos dinâmicos e adaptáveis às mudanças no campo de batalha.
Em contrapartida, desperdícios de tempo devem ser evitados e muitas vezes funcionam como punição por erros nossos: por exemplo, se nos propulsionarmos usando uma plataforma de salto na direção errada e chocarmos contra uma parede, perderemos alguns segundos até que a nossa personagem se levante. O tempo também pode funcionar como elemento de risco-recompensa: pelos mapas que atravessamos, estão espalhados vários esqueletos, que podemos investigar para obtermos dinheiro. Contudo, o ato de investigar consumirá um segundo do tempo que o cientista dispõe. No final de contas, a implementação do tempo é muito intuitiva e leva-nos a equacionar a melhor ponderação de todas as ações de que cada protagonista dispõe e a otimizá-las, por exemplo tentando disparar contra os seres sobrenaturais ao mesmo tempo que caminhamos para o nosso próximo destino.
Para este processo de planeamento
e otimização, a excelente linguagem visual do título é uma mais-valia: em torno
de cada cientista, desenha-se uma circunferência que nos revela os locais mais
distantes que podemos alcançar no turno, e cujo diâmetro vai diminuindo à
medida que gastamos o nosso tempo. Quando empunhamos uma arma, o tempo de que
dispomos é adicionalmente exibido por uma nova circunferência em torno da mira,
que desaparece progressivamente. Também a qualquer momento podemos ceder
controlo dos cientistas e ver todos os cantos do mapa, permitindo-nos localizar
todos os inimigos e estruturas relevantes, ou ativar uma vista estilo mapa, em
que a posição dos cientistas e criaturas sobrenaturais é evidente. A única
mácula de relevo na transmissão de informação ao jogador consiste na apresentação
dos inimigos que dão spawn no mapa depois de cada ronda. A câmara não
foca em nenhum dos seres que surgem, de tal modo que acabamos por aceder quase
sempre à vista de mapa para saber a sua localização no final dos turnos.
Estes seres são responsáveis pela
variedade dos confrontos: cada tipo de inimigos é único em um ou mais aspetos,
como o padrão de movimento, a gama de ataques e fraquezas. Por exemplo, existem
zombies que correm a alta velocidade na nossa direção, explodindo se entrarem
em contacto com os cientistas e atordoando-os – fazendo-nos perder não só
pontos de vida mas também tempo precioso. Por seu lado, os vampiros principalmente
recorrem a ataques de média a longa distância, e uma vez “derrotados” transformam-se
num esqueleto que, se não for exorcizado por um dos heróis nos dois turnos
seguintes, ressuscita e volta a atacar os humanos. Todos os tipos de inimigos têm
algo de único, e é sempre um prazer descobrir novos monstros e o modo como nos
obrigam a repensar as nossas prioridades – especialmente porque a forma de os
encontrar/derrotar nem sempre é evidente e por isso temos de decifrar o seu
calcanhar de Aquiles.
No entanto, acreditamos que eles poderiam ser melhor utilizados. Pelas batalhas que enfrentamos, a posição dos nossos oponentes parece ser escolhida com alguma aleatoriedade. Com um conjunto de inimigos tão rico, preferiríamos que as missões do jogo posicionassem os seres supernaturais em posições estratégicas que nos encorajassem a abordá-los de modos diferentes e não tivessem tanta dependência no recorrente spawn de monstros no final de turnos, que coloca ênfase apenas na sobrevivência e avanço imediatos e contribui para um sentimento de repetição. Este problema é agravado ainda por os objetivos de missões serem poucos e genéricos, resumindo-se a ir de um ponto A até a um ponto B, derrotar todos os inimigos de uma área e investigar algo. E se os inimigos comuns são bastante diversificados, é sentida a falta de bosses que nos ataquem diretamente e/ou tenham fraquezas particulares, que requeiram a combinação dos melhores atributos de cada herói.
Contudo, este problema pode ser
parcialmente considerado como consequência de outro ponto elogioso do jogo: as
armas e gadgets. Os três cientistas podem, desde o início, utilizar três
armas equilibradas em termos de vantagens e desvantagens, mas à medida que
progredimos podemos desbloquear diferentes armas e combiná-las livremente.
Adicionalmente, podemos também
equipar gadgets, utensílios adicionais que podem ajudar-nos em questões
como movimentação e ataque. Por exemplo, o Propellor é uma plataforma de salto
que nós podemos posicionar nas redondezas do nosso herói. Com ela, podemos não
só alcançar locais de maior elevação, mas também interferir na trajetória dos
monstros, que se verão lançados para longe de nós. Por seu lado, o Subdueler é
uma Boombox que faz os monstros na sua frente dançar, não só permitindo que os
humanos e sobrenaturais coloquem as suas diferenças de parte em nome da segunda
arte ou, menos importante, ter a segurança de estar próximo dos inimigos sem
que eles nos ataquem.
Esta liberdade de escolha e a fantástica
gama de opções possibilita que definamos a combinação de armas e o estilo
de jogo mais ajustado para nós. Este facto dificulta a geração de bosses com
fraquezas e propriedades demasiado específicas, mas ainda assim achamos que este
objetivo poderia ter sido alcançado se cada humano tivesse uma ou mais
características distintivas. Em termos de jogabilidade, os três heróis são
praticamente indistinguíveis, sendo que apenas Gary se distingue por ser a
única personagem incapaz de guardar a arma (ação que consome tempo e nos deixa
indefesos, mas que aumenta a nossa velocidade).
Em todo o caso, o desbloqueio das
armas e gadgets faz-se entre missões, usando o dinheiro que obtivemos nestas.
Entre as nossas investidas para reconquistar território, somos levados para um
mapa da Europa. Cada missão que executamos está associada a um país, pelo que
este mapa pode ser considerado como um ecrã de seleção de níveis. Mas podemos
fazer muito mais do que isso: aqui, podemos fundar universidades nos países que
tomamos, investigar os seres sobrenaturais que encontramos e criar novas armas
e gadgets. Também aqui existe um sistema de turnos: estas ações duram
vários dias, e após 40 dias termina a nossa ronda e começa a dos sobrenaturais,
que poderão tentar reconquistar o território que tomamos. Se isto acontecer,
teremos de participar numa missão especial, em que tentamos evitar que os
monstros provoquem demasiado dano à universidade ou em que ativamos medidas de
contra-ataque. Embora a implementação do tempo nesta faceta da jogabilidade promova
uma maior coesão na experiência e uma boa gestão de prioridades nestas secções,
depois das primeiras vezes em que tivemos de participar nas missões de defesa
rapidamente nos cansamos das mesmas por empatarem o nosso progresso na aventura.
Se quiserem jogar com uma segunda
pessoa, gostarão de saber que o jogo inclui essa opção. Jogando a dois, a tela
é dividida horizontalmente e o segundo jogador controlará os seus próprios três
cientistas, podendo agir ao mesmo tempo que o primeiro jogador. Em
contrapartida, os objetivos do mapa serão mais exigentes, para que o nível de
dificuldade seja similar ao da experiência a solo.
Antes de concluirmos a análise,
não podíamos deixar de mencionar as possibilidades de personalização das
personagens. Podemos alterar bastantes parâmetros visuais dos protagonistas,
incluindo tipo de face, cor de pele/cabelo, penteado e cores/padrões das
indumentárias, modificando radicalmente a aparência das personagens, mas
mantendo-as reconhecíveis pelas indumentários e biótipo corporal.
Se ficaram com curiosidade para jogar RESEARCH and DESTROY mas ainda não estão confiantes de que o jogo é para vocês, notem que o jogo está no Xbox Game Pass desde o lançamento. Por isso, se forem membros deste serviço, têm nele a oportunidade de experienciar esta aventura singular!
Conclusão:
Com uma ênfase especial no tempo real, uma apresentação e tom narrativo nostálgicos e uma variada gama de monstros supernaturais
e armas, RESEARCH and DESTROY é um RPG por turnos/táctico sem igual que encoraja
celeridade nas ações sem com isso diminuir o papel do raciocínio. No
entanto, a dependência do jogo de recorrentes spawns de inimigos em
posições aleatórias é antitética à promoção de estratégias e contribui para um
sentimento de repetição, sentimento este agravado pela escassez de objetivos
únicos e bosses.
O melhor:
- Apresentação cartunesca nostálgica;
- Excelente linguagem visual;
- Diálogos simples mas moderadamente engraçados;
- Vasta gama de inimigos e de armas/gadgets.
- Existência de co-op.
O pior:
- Poucos objetivos de missões.
Nota do GameForces: 8.0/10
Desenvolvedora: Implausible Industries
Publicadora: Spike Chunsoft
Ano: 2022
Autor da Análise: Tiago Sá
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