[Análise] Bug Fables: The Everlasting Sapling [NSW]


Se alguma esperança restava de termos um novo Paper Mario seguindo a fórmula dourada, esta foi severamente abalada pelas várias declarações do staff da Intelligent Systems. Em várias instâncias, os membros da equipa por trás dos novos jogos da franquia afirmaram a sua intenção de priorizar a criação de mecânicas de jogo inéditas em vez de recuperar os sistemas do passado. Se a Nintendo não quer fazer um Paper Mario clássico, o que podem os fãs fazer?

Em vez de ficar à espera de uma resposta, a Moonsprout Games arregaçou as mangas e decidiu fazer um ela própria. Bug Fables: The Everlasting Sapling nasceu do desejo dos desenvolvedores de “jogar um jogo como Paper Mario de novo”. E de facto, Bug Fables não tem reservas em importar todos os ingredientes que caracterizaram os primeiros jogos da série clássica, tais como o combate por turnos, a progressão baseada em puzzles o sistema de badges (que aqui se chamam medalhas), e até mesmo a confeção de pratos!


Mas uma coisa teve, obviamente, de ficar de fora: o universo e personagens Mario. Uma grande parte do charme dos jogos Paper Mario decorria de podermos vivenciar e conhecer os familiares mundo e personagens do Mushroom Kingdom num novo contexto. Bug Fables, no entanto, não tinha um universo já estabelecido para o impulsionar; em vez disso, o jogo apresenta-nos Bugaria, uma terra próspera onde vive todo o tipo de insetos. Por este motivo, no começo, não sentimos grande apego a Bugaria ou aos seus habitantes, e mesmo mecanicamente a exploração do mapa se revela demasiado simples. No entanto, depois do 1º capítulo o jogo abre as asas e recompensa aqueles que o quiseram acompanhar.

A nossa jornada inicia-se mais precisamente no Ant Kingdom, onde três aventureiros iniciam a sua jornada para encontrar a Everlasting Sapling, uma planta desejada pela rainha das formigas que é capaz de conceder juventude eterna. Nós controlamos, portanto, o trio composto por Kabuu, um escaravelho com um coração de ouro, Vi, uma abelha de cabeça quente, e Leif, uma traça terra-a-terra. Todos têm a mesma importância na narrativa, mas cada um tem personalidade, desejos e motivações próprios. É cativante acompanhar estes heróis, inicialmente desconhecidos unidos por conveniência, à medida que se conhecem melhor, tornando-se organicamente num grupo de genuínos amigos.

Esta evolução da equipa é conseguida graças à excelente escrita que permeia a globalidade de Bug Fables. Todas as personagens relevantes da trama estão bem realizadas, de tal forma que as interações entre elas soam naturais, desde o humor leve do jogo aos momentos mais sentimentais da narrativa. Também os NPCs espalhados pelos vários reinos de Bugaria têm comentários interessantes a tecer, sendo bastante distintos e reconhecíveis e trazendo por isso mais vida a cada região deste rico mundo.   


O charme deste mundo decorre também do seu estilo artístico. Como já devem adivinhar, este assume o estilo de livro pop-up de Paper Mario com personagens finas como folhas de papel a percorrer um mundo tridimensional. Estes visuais são apelativos tal como já o eram em 2000, mas ao mesmo tempo parecem demasiado simples em vários momentos, como se não se tivessem desprendido completamente da consola que inspirou os desenvolvedores. Na maior parte dos momentos, contudo, as áreas são visualmente apelativas, originais e muito variadas. É de louvar o modo como a temática insectóide é aproveitada para enriquecer a variedade e memorabilidade de Bugaria, com o uso de estilos característicos de arquitetura e de diferentes espécies a conceder um charme único a cada segmento do mapa.

Para podermos explorar e progredir nestes territórios, teremos de recorrer às habilidades dos protagonistas para resolver os mais diversos puzzles. Embora a equipa se mantenha limitada aos três companheiros até ao final da experiência, a exploração é progressivamente revigorada com o desbloqueio de novas habilidades para cada uma das personagens. Estas habilidades das personagens não só são usadas de modo individual, mas também têm interatividade entre si, o que resulta em quebra-cabeças bastante inventivos (mais do que os de Paper Mario). Isto poderia significar que teríamos de perder tempo a trocar entre as personagens, mas como podemos fazê-lo com o uso de um único botão, o ritmo da experiência mantém-se sempre fluido.


A importância individual de cada um dos heróis está patente nos próprios combates. Dizer que as mecânicas de batalha foram “inspiradas” por Paper Mario seria uma fraqueza de expressão. As lutas de Bug Fables desenrolam-se em ataques por turnos, com a possibilidade de realizar action commands para aumentar o dano infligido ou bloquear os ataques adversários, e que são mais difíceis de realizar neste título do que nos Paper Mario. Nos nossos turnos, podemos fazer um ataque normal ou gastar alguns pontos TP para realizar ataques com mais dano ou com condições particulares. Fora da batalha, podemos equipar uma série de medalhas, itens encontrados no mapa, adquiridos em sidequests ou comprados em lojas. Estes têm variadíssimos efeitos, tais como maior resistência a status effects ou novos ataques. Como não podia deixar de ser, podemos melhorar os nossos pontos HP, TP e espaços para medalhas ao avançarmos de nível, algo que conseguimos derrotando inimigos e obtendo os pontos de experiência que eles nos concedem.

Já ouvimos esta história toda antes, mas felizmente Bug Fables dá o seu toque especial à fórmula testada. Os três protagonistas estão presentes nos combates em conjunto, e as suas abordagens de ataque bastante diferentes complementam-se: Kabbu é capaz de quebrar as posições defensivas dos inimigos, Vi consegue atingir inimigos no ar e Leif faz emergir inimigos que se refugiam debaixo do solo. Consoante as circunstâncias que experienciamos, determinadas personagens podem ser mais ou menos vantajosas. É por isso que o jogo introduz o conceito de Turn Relay: podemos ceder o turno de um inseto a outro, que poderá atacar mais de uma vez na mesma ronda. Em contrapartida, cada ataque sucessivo do mesmo herói terá menor impacto, devido à exaustão acumulada.

Além disso, nós podemos alterar a disposição dos protagonistas na batalha. Aquele que estiver na frente terá maior poder de ataque, mas será mais vezes atacado pelos adversários. Este conjunto de alterações, não sendo revolucionário, confere um maior nível de estratégia e de opções de escolha que representa uma evolução natural e madura das ideias que usou como base.


E estratégia é algo que não podemos descurar, especialmente se jogarmos em Hard Mode. No começo da aventura, é nos dada uma medalha que aumenta a dificuldade dos confrontos, para um maior nível de desafio. Isto significa que os jogadores podem livremente testar as alterações que esta implica e desativarem-na permanente ou temporariamente consoante os seus desejos e necessidades. Eu mantive-a equipada durante toda a experiência, e constatei o nível acrescido de dificuldade não só aumentou as necessidades de planeamento das batalhas, mas também condicionou o modo como encarei os encontros com os inimigos no mapa. Enquanto que, nos jogos Paper Mario, é fácil derrotar todos os inimigos na nossa frente sem sofrermos mossas, em Bug Fables cada inimigo significa um dreno de HP, TP e potencialmente itens, pelo que é importante equacionar o nosso ganho de experiência e berries (a moeda do jogo) com a possibilidade de perecermos antes de encontrarmos o próximo save point.

Nas batalhas contra bosses, por seu lado, tornou-se frequente não conseguir derrotar os oponentes na primeira tentativa, pelo que esta aproximação inicial passou a funcionar em alguns casos como uma missão de reconhecimento em que eu aprendia os padrões de ataque e as características próprias do antagonista, para depois poder empregar na 2ª tentativa o conjunto de medalhas e ataques que mais se adaptam à circunstância. Nunca senti que este nível adicional de desafio fosse injusto; na verdade, foi muito bem-vindo, por dar um peso maior às batalhas do que elas alguma vez tinham tido em Paper Mario e gerar um incomensurável sentimento de vitória quando as ultrapassamos. 


Este jogo tem portanto dificuldade para aqueles que a procuram, mas o que não falta também é formas de nos prepararmos para ela. Não só podemos explorar atentamente o mapa para encontrar medalhas e itens, mas também podemos realizar um rol de sidequests com diferentes resultados positivos. Inicialmente, as missões paralelas que recebemos são as típicas fetch quests e alguns pseudo-tutoriais para mecânicas como as dormidas em pousadas, mas não tarda até a sua escala e qualidade amplificarem. Passamos a vivenciar pequenas histórias com os NPCs que nos fazem simpatizar com eles e em algumas missões chegamos mesmo a descobrir segmentos inéditos de áreas já terminadas do jogo. 

O melhor destas missões opcionais é que algumas delas, para além das recompensas mais práticas que nos concedem, também nos dão a conhecer melhor a história e situação política de Bugaria, e em duas em particular aprendemos o passado dos membros da equipa. A mecânica de Tattle, existente em Paper Mario, regressa em Bug Fables, permitindo com um toque de um botão ouvir os pensamentos e opiniões da equipa sobre os locais que visitam e os inimigos que enfrentam. Muitos jogadores provavelmente ignorarão estas falas extra, pelo que é admirável a devoção dos redatores deste jogo na criação desta quantidade imensa de diálogos adicionais.

Para além de todas estas missões paralelas, ainda temos acesso a vários minijogos, tais como um jogo de cartas totalmente realizado e Whack-A-Worm, uma reinterpretação do clássico Whack-a-Mole, e modos Boss Rush e Cave of Trials, onde podemos enfrentar sucessivamente vários os inimigos que enfrentamos ao longo da campanha. Não há dúvidas: conteúdo extra é o que não falta em Bug Fables.


Não podia deixar de referir a banda sonora do jogo, que está recheada de excelentes composições que encaixam perfeitamente a ação a ocorrer. Desde as músicas energéticas de batalha aos temas tenebrosos que acompanham as áreas mais sombrias, é de louvar a capacidade da banda sonora de ostentar tanta variedade, buscar inspiração em títulos do passado e ao mesmo tempo manter uma identidade muito própria.

Se há um ponto onde este título peca, é na performance. Durante quase toda a experiência, o jogo mantém-se nuns sólidos 60 fotogramas por segundo, mas nalgumas áreas do mapa experienciei algum lentidão na ação. Para além disso, nas regiões finais do jogo, o jogo apresentou em alguns momentos situações de stutter. Felizmente, estes problemas são raros e nunca ocorreram durante as batalhas, pelo que nunca afetaram os comandos dependentes de timing.

Conclusão
Com a reutilização das mecânicas que fizeram de Paper Mario o jogo aclamado que ele é, muitos poderiam ficar com uma pulga atrás da orelha, receando estar perante uma imitação barata do original. Mas não fiquem a apanhar moscas: Bug Fables é uma experiência de excelência que dedicou minuciosa atenção em todas as suas componentes, entregando-nos uma aventura que honra tudo aquilo que marcou Paper Mario e ultrapassando-o em alguns aspetos, ao mesmo tempo que nos dá um novo mundo e personagens com as quais realmente nos importamos.

O melhor
 - Mundo e personagens bem realizados;
- Sistema de combate sólido;
- Banda sonora excelente;
- Visuais apelativos e nostálgicos;
- Hard Mode gratificante.

O pior
- Leves problemas de performance;
- Aparência básica em certas situações;
- Começo lento.

Nota do GameForces: 9.0

Nota: Esta análise foi realizada com base na versão digital do jogo para a Nintendo Switch, através de um código gentilmente cedido pela DANGEN Entertainment.

Título: Bug Fables: The Everlasting Sapling
Desenvolvedora: Moonsprout Games
Publicadora: DANGEN Entertainment
Ano: 2019-2020

Autor da Análise: Tiago Sá

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[Análise] Bug Fables: The Everlasting Sapling [NSW] [Análise] Bug Fables: The Everlasting Sapling [NSW] Reviewed by Tiago Sá on julho 25, 2020 Rating: 5

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