Star Wars é aquele franchise que todos adoramos, certo?
Uns adoram adorar, outros adoram odiar, mas uma coisa é certa – quase ninguém é
indiferente às histórias contadas numa galáxia muito, muito longe. Com a
produção fílmica e televisiva a continuar a apresentar níveis de qualidade incrivelmente
oscilantes, é para os videojogos que os fãs dos sabres de luz olham com uma
réstia de esperança. Depois do estrondoso sucesso que foi Fallen Order,
a Respawn e a EA voltam a convidar-nos para este universo e para a pele do Jedi
sobrevivente Cal Kestis. Será Star Wars Jedi: Survivor um grande
regresso do Jedi, ou uma experiência que nos deixa completamente sem Força?
Sim, sim, vamos
já ao encontro do enorme AT-AT na sala. Do ponto de vista técnico, e no preciso
momento em que escrevo estas palavras, Star Wars Jedi: Survivor é e
continua a ser um desastre. O modo de desempenho mal se aguenta nos 60
fotogramas por segundo, caindo muito frequentemente para os 50 mesmo quando a
ação é pouca e para um máximo de 30 quando há muitas faíscas ou gotículas de
água a voar. Isto para não falar da qualidade de imagem, que nesse mesmo modo é
incrivelmente baixa. Mas mesmo no modo de qualidade, o desempenho mal se
aguenta nos 30 FPS, podendo chegar até a uns míseros 10 quando a intensidade da
ação é alta.
Mas há problemas
transversais aos modos gráficos. Os rasgões no ecrã (screen tearing) são
uma ocorrência constante. A quantidade de pop-up de elementos ambientais ou de
texturas a carregarem pouco a pouco à frente fazem tanta companhia a Cal
como o pequeno BD-1. Por falar neles, sempre que levamos o nosso protagonista a
movimentar-se fica com umas quantas sombras suas e do seu droide no ecrã, parecendo
aquele efeito especial dos filmes Ant-Man da Marvel. E o sistema de leis
da física também deixa bastante a desejar, com as animações de colisão de
personagens com o ambiente a ser incrivelmente tosco e a gerar comportamentos
estranhos. E sim, o jogo também foi abaixo – só uma vez e sem perdas de
progresso, mas não podia deixar de assinalar.
“Ui, lá vai este
arrasar de alto a baixo o jogo, já consigo ver a nota baixíssima!” Fora os
palavrões no meio, dependendo do quão fanáticos são por Star Wars,
imagino que muitos de vós estejam agora a pensar algo deste género. Mas estão
enganados. Eu simplesmente adoro este jogo! É o primeiro jogo este ano que me
agarrou completamente e que, não fosse ter outras obrigações, não teria largado
por opção própria. Sim, estes problemas todos moem-me o juízo (e os olhos), mas
não beliscam sequer o entusiasmo, a diversão e o prazer que Jedi: Survivor
me proporcionou.
Em Star Wars
Jedi: Survivor voltamos a encarnar Cal Kestis, um dos poucos sobreviventes
da infame ordem 66 e que no jogo anterior começou a reaprender e a desenvolver
os seus poderes da Força e a readquirir a sua proficiência no uso do seu sabre
de luz. Passados alguns anos desde o fim de Fallen Order, Cal
continua acompanhado de BD-1, mas separou-se do resto da tripulação da nave
Mantis. Começamos por encontrar Cal no familiar planeta Coruscant, na sua mais
recente missão para o líder dos rebeldes, Saw Gerrera. Mas no culminar dessa
missão, Cal percebe que o alcance do Império é muito maior do que imaginava e
que anos de luta mal impingiram uma amolgadela.
Com isto em
mente, Cal acaba por dar início ao reatar das relações com os seus antigos
amigos, juntamente com o seu novo aliado Bode Akuna. Pelo meio, depara-se com
provas concretas da existência de Tanalorr, um mítico planeta escondido e fora
do alcance das garras do Império. Acreditando que este planeta pode ser usado
para construir um lar e abrigar todos os perseguidos pelos inquisidores
imperiais, Cal inicia uma busca pelo caminho até Tanalorr, tendo de enfrentar
novas forças imperiais e um grupo de salteadores liderados por dois seres
antigos incrivelmente perigosos e poderosos.
A história foi
sempre cativante, e enquanto fã que consome um bom bocado de conteúdo para lá
das três trilogias de filmes, tocou sempre em assuntos que me interessaram. A narrativa
mostrou vários elementos e acontecimentos da “High Republic Era” séculos antes
do nascimento de Cal, e os arcos narrativos foram sempre bastante apelativos. O
conflito interior de continuar uma luta fútil contra um Império invencível,
versus a possibilidade de começar uma vida de paz e segurança nova deu a Cal um
boost de personalidade e carisma bastante necessário. Aqui há também, claro,
imenso mérito do fantástico ator que lhe dá vida, Cameron Monaghan, bem como do
restante elenco, com todos a contribuírem com desempenhos fenomenais.
Mas mesmo com uma
mão cheia de cenas de grande qualidade, sentia que faltava algo, uma motivação
entusiasmante para continuar a ajudar o nosso protagonista. Felizmente, esta
veio com o twist do último terço do jogo, que elevou a fasquia de toda a
jornada de Cal. É um twist previsível, sobretudo para quem conhece mais ou
menos as estruturas narrativas de Star Wars, mas é igualmente eficaz em
tornar as últimas horas do jogo incrivelmente empolgantes.
Mesmo quando a
narrativa não estava a ser assim tão empolgante como gostaria, houve sempre uma
vertente do jogo que me manteve agarrado ao comando: a jogabilidade. Lembram-se
do combate de ataques frenéticos, timings de contra-ataques precisos, numerosas
habilidades da Força para dominar, e inimigos ferozes e desafiantes para
enfrentar de Jedi: Fallen Order? Dupliquem praticamente isso
tudo, e temos Jedi: Survivor. Agora temos cinco posturas de combate com
o sabre de luz para dominar, cada postura tem uma árvore de habilidades
recheada de manobras novas e específicas. Acrescentem ainda mais poderes da
Força para além do puxão, empurrão e desacelerar temporal que já tínhamos. E
ainda um novo sistema de vantagens equipáveis, que nos permitem, por exemplo,
ser mais eficientes a quebrar defesas inimigas ou recuperar vida sempre que
usamos a Força.
A variedade de
inimigos humanoides, animalescos e robóticos é ainda maior, obrigando-nos a ser
ainda mais adaptativos às circunstâncias. Entre especialistas no combate corpo
a corpo e proficientes em disparos, as combinações de inimigos são incrivelmente
variadas – por vezes até diabólicas. Senti sempre que tinha de estar em alerta
e no meu melhor, senão poderia ser assoberbado pela quantidade de inimigos no
ecrã, particularmente durante os combates contra bosses e caçadores de
recompensas. Estes inimigos são os que têm leques de manobras e abordagens ao
combate mais variados e impactantes. Bem, exceto um boss, que é uma piada
divertida. E por falar nisso, a cereja no topo do bolo é que alguns dos novos
inimigos do jogo são os droides de batalha B1, que, claro, vêm com todos os
seus diálogos absolutamente hilariantes.
Se estão a pensar
que o combate parece ser maior e melhor do que o que vimos no antecessor, estão
totalmente certos. Foi incrivelmente divertido ir experimentando as cinco posturas
contra diferentes inimigos e bosses, e foi sempre entusiasmante desbloquear
novas habilidades e ir experimentá-las em combate. Mesmo o facto de apenas podermos
ter duas posturas equipadas de cada vez não foi um detrimento, já que me vi a
ficar naturalmente mais apto na combinação que achei mais versátil. Mas todas
as posturas são divertidas, e a quantidade de combinações estilosas e
impactantes que podemos desferir com cada uma é tão grande que não há um único
encontro aborrecido. No que diz respeito a jogos de ação na terceira pessoa,
este pode muito bem ser um dos melhores sistemas de combates de toda a atual
geração!
Mas calma, que o
mote “maior e melhor” não se fica pelo combate. Também a exploração pega nas
plantas desenhadas por Jedi: Fallen Order, e constrói algo
notavelmente superior. Os movimentos de Cal são mais ágeis e fluidos, correndo
e trepando paredes como se tivesse acabado de sair de um jogo nascido da união
de um Prince of Persia com um inFamous – ficando com os melhores
genes de cada um, claro. Para além disso, Cal ganha um gancho praticamente logo
a abrir a narrativa, tornando ainda mais veloz e entusiasmante toda e qualquer
secção de plataformas dos vários mundos que visitamos durante o jogo.
Claro que nada
disto valeria a pena se o design desses mundos não fosse de grande qualidade; e
felizmente, é precisamente o que acontece. Ainda alguns mundos compostos por
corredores praticamente lineares, mas temos dois novos mundos com áreas abertas
gigantes e repletas de construções, de planaltos, de cavernas e de esconderijos
para descobrir e explorar. Estejamos numa área aberta, estejamos numa das
várias localidades com caminhos mais delineados e interligados através dos
variadíssimos atalhos que podemos desbloquear, é impossível não admirar a
minúcia do detalhe. As áreas abertas estão muito bem ligadas às mais lineares,
os pequenos puzzles que vamos resolvendo com os nossos poderes, utensílios e
até upgrades do pequeno BD-1 estão muitíssimo bem montados, e as arenas de
combate têm sempre o tamanho e a abertura ideal para a quantidade e variedade
de inimigos que temos de enfrentar.
Adorei perder-me nos
desertos áridos de Jedha até me deparar com uma formação rochosa suspeita, ou
pelos planaltos verdejantes de Koboh até descobrir uma entrada escondida para
uma gruta. Tanto que quando tinha de viajar para outro planeta para avançar na
narrativa, tirava uma horinha ou duas para explorar áreas novas. Não só porque
adoro as mecânicas de movimentação e plataformas, mas porque havia sempre uma
boa recompensa no final de um novo caminho trilhado. Um boss especial, uma peça
de roupa ou um novo estilo de barba para equipar em Cal, melhorias para a minha
barra de vida ou de Força, ou até salas de desafios que punham à prova o meu
domínio das mecânicas. Há tanto para descobrir e é tão bom encontrar algo novo!
Nunca cheguei ao fim de um caminho escondido para ficar a pensar que tinha
andado a perder tempo, o que apenas reforçava a minha vontade de continuar a
explorar e adiar mais um pouco a progressão na história.
Algo que também
ajuda a enaltecer o prazer destes períodos de exploração é o facto de Jedi:
Survivor ter um mapa muito mais competente do que o seu antecessor.
Claramente a Respawn ouviu as nossas queixas, tornando o mapa muito mais
legível, fácil de manusear e, consequentemente, útil. Não é perfeito, com duas
ou três áreas nas quais é difícil de perceber as ligações entre algumas
plataformas e o sistema de marcação de locais de interesse não adiciona
qualquer indicador no mundo em si. Mas é muito mais fácil encontrar a miríade de
colecionáveis e de itens equipáveis para Cal, BD-1, o sabre de luz e a arma de
fogo que adquirimos a meio da campanha com este mapa – e com o facto de ser
possível transportarmo-nos instantaneamente entre pontos de meditação.
Portanto, três
das maiores queixas que tínhamos da experiência de Jedi: Fallen Order
foram endereçadas nesta sequela: o mapa está melhor, a implementação de viagens
rápidas e a possibilidade de personalizarmos o nosso protagonista literalmente
da ponta dos cabelos até aos pés. E também tenho de destacar algo que eu
receava, mas que não aconteceu: ao contrário do que acontece em vários outros franchises,
Cal não perdeu poderes nem esqueceu tudo o que aprendeu no primeiro jogo. Sim,
começamos Jedi: Survivor já a conseguir usar um duplo salto, a conseguir
usar empurrões e puxões com a Força e a ter consigo o seu respirador para nadar
infinitamente debaixo de água. É uma opção que parece pequena, mas que me
ajudou imenso a regressar a esta galáxia com tanta vontade.
Por fim, não
podia deixar de referir a fantástica banda sonora de Jedi: Survivor. Se
a história parece encaixar que nem uma luva no universo Star Wars, o
trabalho aqui conseguido pelos compositores Stephen Barton e Gordy Haab também
é um contributo importantíssimo. As trilhas mais leves quando passeamos pelos
mundos, a música mais frenética de quando somos detetados por inimigos, e até
uns quantos acordes retirados das obras-primas do lendário John Williams nos
momentos mais altos dos conflitos narrativos – tudo isto fez-me sentir em casa,
numa galáxia muito, muito longe.
De igual forma, os efeitos sonoros encontram-se altamente detalhado, criando não somente uma maior profundidade na caracterização dos ambientes e eventos a ocorrer no ecrã, como também na utilidade prática. Exemplificando, foram inúmeras as vezes que rodeado por inimigos, conseguimos ouvir quando alguém se prepara para nos atacar nas nossas costas (e consequentemente fora do nosso campo de visão) e conseguir reagir em conformidade. Efectivamente, toda a componente auditiva merece um reconhecimento do excelente trabalho desenvolvido.
Conclusões
Star Wars Jedi: Survivor não é só um dos melhores jogos Star Wars de
sempre, é um dos melhores jogos a solo que a EA alguma vez publicou. A
jogabilidade é variada, desafiante e incrivelmente cativante, os mundos abertos
estão impecavelmente bem desenhados, e a história é mais apelativa do que a
maioria dos filmes e séries que saíram na última década. É uma diversão do
início ao fim, e apenas fica de fora da contenda por jogo do ano devido a todos
os problemas técnicos que continuam a assolar a experiência mesmo após várias
atualizações. Se Fallen Order conseguiu atingir o estatuto de
Cavaleiro Jedi, Survivor alcança o nível de Mestre Jedi… ainda que seja
aos solavancos.
O Melhor:
- O combate é
desafiante e variadíssimo, com imensas habilidades para dominar
- Os mundos abertos
são incrivelmente bem desenhados e uma diversão de explorar
- Imensos
colecionáveis, missões secundárias e desafios que são um prazer de encontrar
- A banda sonora é
excelente e os desempenhos de todos os atores é irrepreensível
- Uma narrativa
intrigante, com uma evolução muito boa de todas as personagens, mas…
O Pior:
- … É uma história
que demora muito tempo a ficar empolgante
- Uma gritante
miríade de problemas técnicos e falta de otimização
Pontuação do
GameForces – 9/10
Título: Star Wars Jedi: Survivor
Desenvolvedora: Respawn
Entertainment
Publicadora: Private
Division
Ano: 2023
Nota: Esta análise foi realizada com base na versão digital do
jogo para a PlayStation 5, através de um código gentilmente cedido pela EA e Play
Nxt.
Autor da Análise: Filipe Castro Mesquita
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