Caso todos os que
vierem a ler isto tenham bom gosto e não sigam o que escrevo ou digo
regularmente, convém esclarecer uma coisa: simuladores não costumam ser, de
todo, a minha praia. No entanto, e como tive a oportunidade de referir no meu artigo pessoal dos melhores jogos de 2022, Powerwash Simulator é
algo de diferente, algo de especial que ressoou comigo no curto tempo que
passei com o jogo esporadicamente ao longo do ano passado. A chegada deste título às
consolas PlayStation no início deste ano dá-me, então, uma oportunidade
perfeita para escrever sobre o jogo, por dois motivos. Primeiro, porque há
poucos lançamentos nesta altura, o que me dá tempo para jogar e analisar com
calma. Segundo, porque troféus, baby! Mas será Powerwash Simulator
uma experiência refrescante, ou será apenas um balde de água fria na cara?
Em Powerwash
Simulator assumimos o papel de uma pessoa que acabou de abrir uma companhia
de limpeza a jato, e temos de ir aceitando e realizando trabalhos nessa mesma
área. Sim, é basicamente isto. Fim da análise. Conclusões: Powerwash
Simulator é…
Ok, agora mais a
sério, a premissa é assim tão simples. Começamos por usar o nosso equipamento
de disparo de água a jato para limpar a carrinha do nosso próprio negócio, e
vamos começando a receber, pouco a pouco, propostas para ir fazer limpezas a
jato de vários veículos ou localizações. Cada nível é composto, então, pelos
referidos veículos ou localizações, e temos de ir limpando toda a porcaria dos
mesmos, recebendo dinheiro sempre que uma componente (por exemplo, uma porta de
um carro, ou uma janela de um bungalow) fica totalmente limpa. Esse dinheiro
vai servir para comprarmos pistolas mais poderosas ou novas componentes para
equipar em cada pistola, de modo a ajudar-nos a ser mais eficazes a limpar as
aberturas mais fininhas ou as sujidades mais imundas.
Isto não
significa que o jogo esteja completamente desprovido de narrativa, bem pelo
contrário. Cada trabalho tem um cliente cujo pedido podemos ler, e que nos vai
enviando mensagens para falar da sua vida ou das suas teorias da conspiração
mais loucas à medida que vamos limpar o que nos foi pedido. Normalmente, estas
interações por texto são leves, animadas e divertidas, conseguindo até sacar
uma gargalhada divertida ou duas para quem quiser prestar atenção a este aspeto
do jogo. O destaque vai para o presidente da câmara claramente corrupto que vê
a sua mansão sofrer um ataque de ovos podres e que nos pede para lhe lavarmos a
faixa da mesma sem nos deixar passar o portão, que me deixou a rir quando
percebi o ridículo de todo o seu pedido. Nem todas as pequenas narrativas têm
este calibre - de facto, as últimas são ridículas, mas ao nível de um livro
obscuro de ficção científica que apenas se encontra no fundo de um caixote num
qualquer alfarrabista -, mas há mérito em tentar enquadrar tudo o que fazemos
de forma bem-humorada e divertida.
Quando digo que
estas narrativas são giras para quem quiser usufruir delas, não estou a ser
rígido com as mesmas, mas estou antes a fazê-lo por louvor à experiência da
jogabilidade. Não me perguntem como, nem porquê, mas Powerwash Simulator
é das experiências mais relaxantes e gratificantes que alguma vez tive no que
diz respeito a videojogos. Posso dizer-vos com toda a confiança do mundo que
chegar a um parque de skate que levou com uma enorme bomba de lama em cima (ou
assim parece), e ir lavando pouco a pouco cada centímetro quadrado é das experiências
de jogo que mais satisfação me proporcionou até hoje.
É tão calmante
andar de um lado para o outro e ver uma parede totalmente castanha escura ficar
impecavelmente limpa à medida que o jato de água vai passando pela mesma. E é
tão estupidamente recompensador ver a animação que recapitula todo o processo
no final de cada nível. Nem o facto de haver níveis tão grandes que demorei
vários dias a completar, ou o facto de haver níveis que exigem um nível de
limpeza tão picuinhas (ao ponto de andarmos sempre a carregar no botão que faz
a sujidade brilhar à procura da nesga de sujidade que nos escapa) são fatores
detratores do prazer que é completar cada nível.
Não estou a
brincar quando digo que este jogo foi uma ferramenta de relaxamento perfeita
para o que tem sido um início de ano tão stressante e tão complicado a nível
pessoal. Quando tenho um dia mau, tenho vontade de voltar a empunhar a pistola
de água a jato virtual e voltar a limpar o barco que o presidente da câmara
claramente não vai usar para fugir com todo o dinheiro que branqueou aos
contribuintes deste mundo. Isto mesmo depois de conquistar o troféu de platina. Que o mesmo presidente da câmara não rouba porque não consegue.
Powerwash
Simulator é um jogo tranquilo,
relaxante e que pode (e deve) ser jogado com calma e casualmente. O modo de
história tem imensos níveis para limpar, há ainda contratos especiais que nos
levam, por exemplo, a limpar o Mars Rover, e o jogo tem vindo a receber
conteúdo adicional gratuito que acrescenta ainda mais localidades para lavar, cruzando
o nosso humilde empreendedor com cenários e personagens de outras séries de
jogos aclamadas, como Tomb Raider ou, em breve, Final Fantasy VII.
Há muitos metros quadrados para lavar com calma, capazes de nos proporcionar
dezenas de horas de relaxamento.
Para os jogadores
que requerem algum nível de desafio ou que queiram afirmar-se como os mais
competentes lavadores a jato do mundo, o jogo oferece ainda um modo de
desafios. Estes são basicamente compostos por níveis que já completámos no modo
de história, mas com um de dois twists: há tempos a bater ou há
quantidades máximas de água que podemos usar. Embora não tenha dúvida que
alguns de vós encontrarão muito prazer nestes desafios, não posso deixar de
constatar que estes fazem exatamente o oposto dos restantes níveis – afligem.
De repente, lavar uma mota deixa de ser uma experiência tranquila, para passar
a exigir velocidades perfeitas ou uma utilização exímia das ferramentas que
temos à mão. Só para reforçar, alguns, talvez até muitos, verão este modo como
tão ou mais prazeroso que o resto do jogo. Pessoalmente, achei este contraste bizarro,
e o stress que estes desafios incutiram apenas me fizeram desejar estar a
rejogar os níveis base sem qualquer limite.
Antes de olhar
para os aspetos mais técnicos do jogo, há uma decisão de design curiosa que os
produtores tomaram. Powerwash Simulator tem exatamente zero trilhas
musicais. Não há música nenhuma a tocar durante os níveis, nem sequer nos menus.
Normalmente acharia esta opção bizarra e estaria aqui a teclar furiosamente o
quão ultrajante isto é. Mas aqui… funciona tão bem!
Os sons dos jatos
de água a serem disparados, da água a atingir as diferentes superfícies, e do
efeito sonoro que toca sempre que uma componente do nível ficou completamente
limpa carregam todo o fardo da vertente sonora deste jogo, e fazem-no com
distinção. Os efeitos sonoros são de altíssima qualidade, tanto que ajudam a
imergir profundamente nas tarefas de limpeza ao ponto de ficar a sentir que a
presença de música prejudicaria o prazer geral desta experiência. É uma decisão
tão arriscada quanto acertada, e apenas posso aplaudir os produtores por a
terem tomado.
Passando do que
ouvimos para o que vemos, tenho o gosto de constatar que Powerwash Simulator
é um jogo bonito de se contemplar. Há algumas texturas feias e que se
apresentam com um nível de detalhe muito baixo, mas são raras. A maioria do
jogo apresenta um nível de detalhe gráfico bastante competente, utilizando muitíssimo
bem a cor e os efeitos luminosos. As superfícies metálicas reluzem de um modo
realista, e o contraste entre o acastanhado da sujidade com as cores vibrantes
que encontramos depois de lavar uma superfície são exemplos que denotam um
trabalho gráfico muito bem conseguido. Pena que o highlight da sujidade
ocorra sempre em tons amarelados quando utilizamos esta funcionalidade, tornando
mais difícil encontrar o que nos falta para passar do 99 para o 100% em alguns
níveis – é, de facto, a única queixa consistente que tenho para esta vertente
do jogo.
Infelizmente,
tenho muitas mais queixas no que diz respeito ao desempenho. Normalmente, andar
por aí a empunhar uma pistola e disparar jatos de água acontece de forma
fluida, a 60 fotogramas por segundo. Mesmo que estejamos no início de um nível
muito amplo completamente coberto de porcaria e cliquemos no botão para realçar
a sujidade, o usual é que o jogo continue a correr consistentemente. No
entanto, é nestes níveis amplos, como a estação de metro, que o jogo vai ocasionalmente
congelando durante uma mão cheia de segundos.
Normalmente,
estes níveis com maiores áreas para limpar são também os mais gratificantes de se completar, e o
facto de haver tantas travagens bruscas ao longo das horas que demora concluir
estes níveis é muito problemático. A fluidez da experiência vai toda pelo cano
abaixo, afetando muito a imersão e a satisfação da limpeza. É o problema mais
grave com que me deparei no jogo. Pese embora não estrague completamente o
prazer e o relaxamento que retiro destes níveis, é um problema demasiado
recorrente e significativo que mancha muito do excelente trabalho que os
produtores fizeram.
Conclusões
Powerwash Simulator é uma das experiências mais relaxantes e gratificantes de que tenho
memória com videojogos. A jogabilidade simples e imersiva leva a um autêntico estado
de zen durante dezenas de horas, ficando aquém do nirvana por uma decisão de
design chata e por problemas técnicos que acabam por ser desgastantes. Ainda assim,
é um ótimo jogo para relaxar e lavarmo-nos das nossas irritações e dos
problemas do dia-a-dia, estando aqui uma experiência recomendável mesmo para
quem não é fã deste género de jogos.
O Melhor:
- Jogabilidade
simples, tranquilizante e gratificante
- Ausência de
música funciona bem, sobretudo pelos efeitos sonoros de qualidade
- Miríade de
níveis, modos de jogo e conteúdos adicionais para jogar
- Boa utilização de
cores e de efeitos luminosos, mas…
O Pior:
- O realce da
sujidade é sempre da mesma cor, dificultando algumas tarefas
- Desafios são
bastante stressantes, contrastando com a calma do resto do jogo
- Demasiados
problemas técnicos prejudicam fluidez dos níveis mais complexos
Pontuação do
GameForces – 7.5/10
Título: Powerwash Simulator
Desenvolvedora: Futurlab
Publicadora: Square
Enix
Ano: 2023
Nota: Esta análise foi realizada com base na versão digital do
jogo para a PlayStation 5, adquirida pelo redator.
Autor da Análise: Filipe Castro Mesquita
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