Oito anos. Foram oito
longos anos os que tivemos que esperar até ver e viver a nova aventura da nossa
bruxa preferida do mundo dos videojogos. Depois de uma estreia multiplataforma
que não atraiu a audiência que merecia, e depois de uma aposta acertada por
parte da Nintendo na sua sequela, o regresso de Bayonetta e do seu colorido e
vivaz elenco de amigos era um dos mais antecipados da atual geração de consolas
da gigante japonesa. Depois de ser anunciada no ano de lançamento da Switch, a
espera por esta aventura que promete ser mais estilosa do que nunca chegou finalmente
ao fim. Mas será Bayonetta 3 uma experiência que nos encantará, ou que
nos levará a querer queimar o jogo numa fogueira?
Em Bayonetta 3
voltamos a mergulhar no exagerado e louco mundo onde a nossa bruxa favorita
volta a ser arrastada para uma aventura que decidirá o futuro do mundo. Mas
desta vez não se trata de mais um despique entre Paradiso e Inferno, mas de
toda uma nova força sobrenatural chamada Singularity que utiliza um exército de
homúnculos para eliminar realidades inteiras, de modo a reduzir a existência a
um único universo – o seu. Claro que eventualmente o universo de Bayonetta será
um dos alvos deste novo inimigo, portanto teremos de ajudar a carismática bruxa a
navegar diferentes universos e realidades para pôr fim a mais uma presunçosa
ameaça.
Se normalmente eu
estou firmemente no campo de que as histórias destes jogos são uma confusão que
roça o ridículo, esta postura não podia estar mais longe da verdade quando se
trata de Bayonetta 3. A história não só é genuinamente boa, emotiva e
com reviravoltas interessantes (embora previsíveis), como… faz sentido! As
motivações inimigas são claras, os objetivos dos bons da fita estão bem definidos,
e todo o percurso até ao culminar da narrativa é extremamente cativante. As reviravoltas caídas do céu sem qualquer tipo de antecipação já lá vão, aqui está tudo muito mais bem delineado, com a trama bem definida e com um crescendo muito bom.
Esta é a primeira
grande e mais-valia deste jogo face aos antecessores: não só adoro Bayonetta,
Luka, Jeanne ou Rodin pelas suas personalidades exageradas e divertidíssimas,
mas também adoro os arcos narrativos de todas as personagens regressadas e como
estes se misturam com as novas personagens, como Viola e todas as Bayonettas de
universos alternativos. Pela primeira vez, uma narrativa de Bayonetta
não é só interessante, mas, quem diria, é perfeitamente percetível!
De resto, Bayonetta
3 volta a ser um jogo que assenta perfeitamente no subgénero de ação hack
and slash. Em combate, volta a haver um botão para ataques com as mãos,
outro para ataques com os pés e um para disparar as várias armas de fogo que
Bayonetta traz consigo. Podemos fazer combinações destes três tipos de ataques
de modo a levar a protagonista a executar manobras tão estilosas como
devastadoras, sendo um verdadeiro prazer brincar com estas combinações e ver no
que resultam. E sim, voltamos a ter um botão de esquiva que, quando clicado no
momento certo antes de um ataque nos acertar, faz com que o tempo desacelere
momentaneamente, dando-nos uma oportunidade de experimentar novas combinações
ou aplicar uma que sabemos ser devastadora.
Posto isto, já
consigo ouvir alguns de vós a perguntar o que há de novo. Primeiro, que rudes.
Segundo, que impacientes. Terceiro, coisas giras, é o que há de novo. Que
coisas giras são essas, perguntam vocês? Para começar, o leque de combinações
que Bayonetta tem à sua disposição é ainda maior do que nos jogos anteriores.
Nem sei dizer quantas vezes estava a tentar executar um ataque específico,
carreguei sem querer uma vez a mais ou a menos num dos botões, e fiquei a
testemunhar um ataque completamente novo que fui imediatamente procurar como
replicar. E claro que, com isto, vêm novas animações e novas habilidades de
tortura que são sempre divertidos de executar e de contemplar.
E se isto não
chega, não se preocupem porque agora é possível utilizar muito mais os demónios
com os quais Bayonetta tem contrato. Estão a ver como estes eram utilizados em
jogos passados, durante sequências cinemáticas ou de ação muito esporádicas e
específicas? Agora não, neste jogo é possível integrá-los no combate normal,
levando-os a dar uma última chapadona no final de uma combinação, ou até mesmo
evocá-los por um período de tempo limitado para despachar inimigos numerosos ou
particularmente rijos. Portanto, a variedade de combate já é bastante boa, não?
Mas há mais!
Sempre que envergamos por um novo universo e resolvemos uma história que
envolva uma versão alternativa de Bayonetta, recebemos não só novos demónios
para usar, como uma nova arma que podemos equipar. E claro que cada demónio e
cada arma tem o seu leque de ataques e habilidades. Mas há ainda mais! Não é só
com a “nossa” Bayonetta que jogamos, havendo certos momentos da narrativa em
que assumimos o papel de outras Bayonettas de realidades paralelas ou o da nova
personagem Viola, cada qual com todo um novo leque de habilidades ofensivas
para aprender e dominar. Portanto sim, este jogo pega na jogabilidade de
combate já excelente dos antecessores, mete a sexta no que à variedade diz
respeito, e oferece uma experiência ainda mais estilosa e cativante do que
antes.
Os mais gulosos
que não se preocupem, porque a jogabilidade não se fica por aqui! Dentro dos
níveis há, ocasionalmente, secções de disparos em carris (estilo Panzer
Dragoon e afins). Nestas, estamos normalmente às costas de um demónio que evocamos
e temos de nos ir defendendo de ataques de criaturas fiéis a Singularity
enquanto voamos pelo mundo. Mas como isto não é propriamente algo de novo, que
tal batalhas de Kaiju? Sim, as batalhas de bosses voltam a ser um ponto alto de
um jogo Bayonetta, sobretudo quando as batalhas se tornam autênticos
confrontos entre criaturas que podiam perfeitamente ultrapassar em altura os
maiores arranha-céus do mundo. Acreditem, no que à variedade diz respeito, Bayonetta
3 é um presente que não acaba. E o melhor é que tem quase tudo um nível de
qualidade elevadíssimo.
Repararam naquele
“quase” maroto da última frase? Sim, infelizmente há alguns tiros ao lado que
tornam a experiência menos encantadora. Primeiro, tenho de destacar
negativamente uma vertente que não surpreenderá a maioria: a câmara. A ação é
tão caótica, frenética e explosiva que, muitas vezes, a câmara se torna um
empecilho. Desde ficar presa em ângulos que prejudicam a nossa visão de onde a
personagem jogável está e do que está a fazer até momentos em que se move
inesperadamente para dar um destaque repentino a algo que vai ser importante
numa sequência de ação que aí vem, a câmara volta a ser uma das grandes
fraquezas deste jogo.
Outra das grandes
fraquezas é algo que lamento mesmo muito, porque foi uma experiência que a
equipa tentou fazer e que, a meu ver, não correu tão bem. Falo de alguns níveis
especiais com Jeanne, que vão surgindo intercalados com a história contada nos
níveis habituais. Estes são níveis de ação furtiva jogados em 2.5D – imaginem o
que seria um “Metal Gear Bayonetta” neste estilo, mas não tão fixe
assim.
Embora tenha
alguma piada entrar em ventilações e ir eliminando inimigos homúnculos sem que
eles se apercebam, os movimentos de Jeanne nunca são tão precisos, parecem
sempre ser demasiado flutuantes. Combater inimigos nunca é divertido nestes
níveis, com um leque de ações muitíssimo reduzido e com os ataques a terem
muito menos impacto do que nos níveis normais. É louvável tentar algo diferente
e tentar dar ainda mais variedade à experiência, mas entrava em desespero
sempre que vinha aí mais um destes níveis. Quando voltar a pegar em Bayonetta
3, tratarei de regressar a todos os níveis exceto estes.
Sim, sim, porque este é um jogo no qual quererão voltar a pegar quando atingirem os créditos finais. Não só pelo quão divertidos e estilosos são todos os níveis “a sério,” mas porque há aqui um valor de rejogabilidade fenomenal. Para além do já
habitual sistema de classificação dos desempenhos, cada nível tem tanto por descobrir! Desde arenas de
desafios e colecionáveis, até novos objetivos secundários por cada nível e
confrontos com inimigos clássicos de jogos passados. Cada nível está mais
apetrechado de conteúdo secundário, muito dele bastante bem escondido e sempre
impecavelmente sintonizado com o design geral dos níveis – aqui mais amplos e
mais divertidos de explorar do que nunca. Muito facilmente vão querer
transformar as 15 horas da história,
em 50 ou 60 horas para dominar cada nível de dificuldade, cada desafio extra e
encontrar cada item meticulosamente escondido. E nem vão dar pela falta do modo multijogador meio cooperativo e meio competitivo que Bayonetta 2 tinha. Se gostavam daquele modo terão pena de não voltar a marcar aqui presença, mas já há aqui tanto para fazer que dificilmente afetará o prazer que retiram desta experiência.
Agora, enquanto
passamos para as vertentes mais técnicas de Bayonetta 3, peço-vos um favor:
imaginem-me a suspirar profundamente e com algum desespero. Porque é aqui que
está o verdadeiro calcanhar de Aquiles de toda esta experiência. Mas comecemos
pelo que há de bom nestes aspetos do jogo. Os designs das personagens
principais e de todos os inimigos e bosses evidenciam um nível de detalhe bom e
polido, e todas as animações estão muitíssimo bem conseguidas. E é por aqui que
ficam os elogios. Quase tudo o resto é um desastre. Os ambientes parecem ter
sido diretamente retirados de um jogo de lançamento da PlayStation 3, de tão nublados,
pixelizados e pouco detalhados que estão. E o desempenho parece sofrer de uma
perturbação de personalidade borderline: ou atinge (ainda que muito raramente)
os 50 ou até 60 fotogramas por segundo, ou se arrasta pela lama a 20 e,
eventualmente, 15 FPS.
Há aqui muita
falta de polimento gráfico, e diria que demasiada ambição técnica que a Nintendo
Switch não é capaz de acompanhar. Um exemplo bem sugestivo disto: Bayonetta
3 apresenta imensos efeitos de partículas e de luz que poucos (ou nenhuns)
outros títulos desta consola tentaram, e o resultado é sempre a imagem a
arrastar-se de frame para frame, sendo quase possível contar cada um. Honestamente,
apenas me passava pela cabeça como seria ver Bayonetta 3 numa PS5 ou
numa Xbox Series X|S, porque claramente a Switch não consegue aguentar o que
aqui foi tentado. Felizmente, embora estes problemas fossem notórios, o prazer da
jogabilidade e dos momentos de combate nunca foram assim tão prejudicados. É
estranho o jogo aguentar-se melhor (mas não perfeitamente) nestes momentos mais
frenéticos, mas ser incapaz de exibir uma cutscene sem parecer aquelas
animações que fazíamos em blocos de notas ou de post-its quando éramos
crianças.
Mas para terminar
em beleza, nada como fazer chover elogios em todo o design sonoro. Os sons dos
ataques e dos rugidos dos monstros são sempre impressionantes, a música é perfeita
para cada momento, variando de género consoante a personagem que controlamos. E
o que dizer dos desempenhos? Deliciosamente exagerados, cheios de atitude
provocatória e com momentos de soberba quando necessário. São simplesmente brilhantes,
acentuando bem cada personalidade e elevando cada linha de diálogo. E uma
última palavra de apreço e de destaque para Jennifer Hale, que assumiu
perfeitamente o papel de Bayonetta, diria até que elevou a personagem. Não
merecia ter sido arrastada para toda a controvérsia nas semanas que antecederam
a saída do jogo, merecia antes ter sido nomeada para um Game Award.
Conclusões
Bayonetta 3 é daqueles jogos em que não podemos evitar sentir-nos bem enquanto
jogamos. Pegando no trabalho do jogo anterior e melhorando-o em praticamente
todos os aspetos, este título oferece-nos uma jogabilidade muito mais diversa e
divertida e uma história mais consistente e apelativa com excelentes
personagens e reviravoltas tocantes. Nem o facto de estar a um passo do
desastre de um ponto de vista técnico impede Bayonetta 3 de ser um dos
jogos mais fáceis de recomendar a toda a gente este ano.
O Melhor:
- História
cativante e emocionante do princípio ao fim
- Jogabilidade mais
variada, estilosa e entusiasmante da série até agora
- Desempenhos dos
atores são todos excelentes, com destaque para o de Jennifer Hale
- Imenso conteúdo
para usufruir pode entreter fãs durante dezenas de horas
O Pior:
- Muito
inconsistente graficamente e em termos de performance
- Câmara é
ocasionalmente problemática
- Níveis de Jeanne
deixam algo a desejar
Pontuação do
GameForces – 8.5/10
Título: Bayonetta 3
Desenvolvedora: Platinum
Games
Publicadora: Nintendo
Ano: 2022
Nota: Esta análise foi realizada com base na versão digital do
jogo para a Nintendo Switch, através de um código gentilmente cedido pela Nintendo
Portugal.
Autor da Análise: Filipe Castro Mesquita
Sem comentários: