Xenoblade Chronicles 3, Splatoon
3, Bayonetta 3. Estes títulos de 2022 têm vários pontos em comum: todos correspondem à terceira entrada de séries
exclusivas da Nintendo cujo antecessor direto já se encontra disponível para a
Nintendo Switch. Todavia, um fator distingue Splatoon das restantes propriedades:
esta jovem franquia é focada em multijogador online, enquanto Bayonetta
e Xenoblade Chronicles são experiências para um jogador.
Não é usual a Nintendo ter dois jogos de uma série focada em multiplayer na mesma consola, embora existam raras exceções como os títulos Mario Party. No que toca a franquias como Mario Kart e Super Smash Bros., cada consola tem direito a uma nova iteração que substitui o seu predecessor imediato. Com o anúncio de Splatoon 3, ficamos intrigados: que novidades é que a Nintendo introduziu à fórmula de Splatoon 2 para convencer os mais de 13 milhões de jogadores a migrar?
Esta pergunta terá de marinar um pouco porque, antes de mais, convém explicarmos brevemente a série para quem não a conhece. Em Splatoon, controlamos Inklings e Octolings, lulas e polvos antropomórficos que usam todo o tipo de armas para espalharem tinta ao seu redor e derrotarem oponentes. Assumindo a forma lula/polvo, estas personagens podem nadar dentro da tinta que dispararam para se moverem mais rapidamente e para recarregarem a sua tinta, mas tornar-se-ão mais vulneráveis se caminharem na tinta da cor do adversário – resultando num jogo de tiros especial em que temos de equilibrar os ataques diretos aos inimigos com o domínio de território!
Em Splatoon 1 e 2, a forma “ideal”
de nos ambientarmos a esta jogabilidade era o Modo História. Contudo, os níveis
do Modos História raramente aprofundavam as suas mecânicas e por causa disso revelavam-se
simplórios e desinspirados, firmando estas campanhas como tutoriais
glorificados e exageradamente prolongados.
Ao começar o Return of the Mammalians, o Modo História do novo título, receava estar diante mais do mesmo, uma vez que a secção inicial da campanha é delineada pelos níveis básicos a que estávamos habituados. Mas, assim que derrotamos o primeiro boss, somos despejados numa nova região: Alterna. E quando comecei um dos seus níveis, senti uma onda de regozijo! Em cada nível, temos de escolher entre uma arma de um máximo de três pré-determinados, antes de iniciarmos uma missão que pode ter diferentes tipos de objetivos. Soa-vos familiar? É a mesma fórmula da DLC Octo Expansion do segundo jogo, e um auspicioso sinal de que o Modo História mudaria para muito, muito melhor.
Cada missão de Splatoon 3 tem algo de singular a oferecer, e aproveita as suas armas destacadas com extrema criatividade em desafios que requerem que exploremos as suas valências. Por exemplo, numa missão temos de chegar à meta sem tocar na tinta inimiga, e apenas podemos usar Curling Bombs com uma quantidade de tinta limitada. Consequentemente, temos de angular cautelosamente os nossos arremessos para que esta bomba desenhe um caminho viável para nós! Numa série de níveis, usamos o novo especial Zipcaster, que nos permite esticar o braço para saltarmos de parede em parede, para chegar à meta, como uma espécie de Homem-Aranha. Existe ainda uma missão em que não possuímos qualquer armamento e que nos obriga a saltar no timing certo para não sermos derrotados pelas ondas de choque que atravessam o solo!
Os desafios concluídos de Return
of the Mammalians recompensam-nos com Power Eggs, que são necessários para
explorarmos devidamente Alterna e progredirmos na história. As áreas da região estão bloqueadas por Fuzzy Ooze, uma substância perigosa capaz de
transformar os Inklings e Octolings em mamíferos, e que só pode ser limpa usando Power Eggs. Não é necessário limpar toda esta matéria misteriosa para
avançar na história, pelo que o jogador é livre para decidir quantos e quais níveis termina.
Se optarem por terminar a maioria ou todas as missões de Alterna e limpar toda a região, poderão encontrar resmas e resmas de
colecionáveis opcionais, como Sunken Scrolls e decorações. Alguns são imediatamente aparentes, mas muitos estão invisíveis e só se revelarão
se dispararmos contra a sua localização repetidamente. Apesar de recebermos algumas ajudas para os encontrarmos, a jornada até aos 100% pode estagnar
e tornar-se entediante nestes momentos. Por isso, preferiríamos que parte destes itens fosse oferecida nos próprios níveis como
recompensa pela realização de objetivos opcionais (à semelhança de Kirby and the
Forgotten Land).
Em conclusão, Return of the
Mammalians é uma fascinante surpresa positiva e o melhor Modo História da série. Se nos
jogos anteriores as campanhas base para um jogador se afiguraram como experiências
secundárias, em Splatoon 3 a aventura é indubitavelmente um dos pontos mais fortes do
pacote. E para os fãs mais acérrimos da série, esta história aborda em detalhe
inesperado o passado deste mundo de lulas e polvos antropomórficos!
Posta esta excelente introdução a
Splatoon 3, chegou a hora de saltarmos para o sumo desta série: as batalhas contra jogadores de todo o mundo, em equipas de quatro contra quatro, nos vários
modos que regressam de Splatoon 2. Em Turf War, o modo mais casual, o nosso
principal objetivo é pintar mais área do mapa do que os nossos oponentes ao longo de
três minutos. Pela primeira vez na série, estes combates podem ser jogados numa equipa fixa com amigos! Já Anarchy Battle é o modo competitivo de Splatoon 3
(substituindo as Ranked Battles) e compreende quatro modos centrados em
objetivos específicos: Splat Zones, Tower Control, Rainmaker e Clam Blitz.
As Anarchy Battles dividem-se em dois tipos: Open e Series. Anarchy Battle Open é similar às Ranked Battles do passado, mas pode ser jogada em equipa com amigos e impacta menos o nosso rank (sendo mais adequada para treinar). Se querem escalar até ao topo, deverão jogar Anarchy Battle Series, em que disputarão partidas sequencialmente até acumularem 5 vitórias ou 3 derrotas. Neste modo, são graduados de acordo com as medalhas que ganharam nas disputas por, por exemplo, terem derrotado o maior número de jogadores ou terem pintado maior área de terreno. Este sistema é muito bem pensado e possibilita que, mesmo após sucessivas derrotas, avancemos no rank, deixando-nos menos à mercê de equipas menos dotadas!
Ocasionalmente, terão a
oportunidade de participar em Splatfests. Nestes eventos, jogadores de
todo o mundo dividem-se em três equipas, como Pedra, Papel e Tesoura, e
competem entre si em batalhas de Turf War. Para além das Turf War normais, nas
horas finais de uma Splatfest poderão participar em Tricolor Turf Wars, em que
a equipa na liderança tem de se defender de dois pares de jogadores
das restantes equipas. Embora interessantes em conceito, estas podem ser um pouco injustas para a equipa à defesa por, por exemplo, a confinarem à área central do mapa.
As partidas em si são, bem,
partidas de Splatoon: frenéticas, viciantes e divertidas para todas as idades e níveis de habilidade. Em nenhum aspeto Splatoon 3 reinventa a roda, mas mesmo
assim existe uma série de novidades. Para além de podermos caminhar, saltar, disparar
e nadar na nossa tinta, podemos executar duas novas ações: Squid Surge, que permite
escalar paredes com um único impulso, e o salto Squid Roll, que permite uma
mudança rápida de direção e nos torna momentaneamente invulneráveis. Ambas são
ótimas formas de surpreendermos os nossos oponentes e de finalmente variarmos
os nossos padrões de movimento na forma lula/polvo. Outros pequenos ajustes
foram realizados, como a atribuição de um escudo aos jogadores enquanto estão
próximos da sua base, facilitando a sua recuperação caso os adversários dominem esta área, e a possibilidade de nos projetarmos para qualquer posição
da nossa base após o respawn, permitindo-nos otimizar a nossa
trajectória.
Como não podia deixar de ser, também temos novidades no campo das armas. Todas as categorias de Splatoon 2 regressam, como shooter e roller, e duas inéditas foram adicionadas: as stringers, armas estilo arco e flecha, e as splatanas, armas estilo espada que disparam raios de tinta após os golpes. Apesar de as armas secundárias (sub-weapons) serem quase todas recicladas do segundo jogo, a maior parte das especiais é nova, com uma minoria a regressar de Splatoon 2. Na nossa opinião, os novos especiais são uma evolução positiva, sendo mais dinâmicos e atingindo um excelente balanço entre darem-nos uma sensação de poder e serem justos para os oponentes. Por exemplo, o Crab Tank é um caranguejo robô capaz de disparar a uma velocidade alucinante, mas que demora a virar-se enquanto dispara e é mais vulnerável na retaguarda!
Na interface, as mudanças são mais numerosas. A título de exemplo, quando apanhamos o Rainmaker, o símbolo desta arma surge no centro do ecrã, anulando a incerteza das situações em que mais de um jogador tenta agarrar a arma. Já quando jogamos Clam Blitz, o número de Clams que cada jogador possui é mostrado junto ao seu ícone no topo do ecrã. Pode ser difícil para muitos valorizar estas mudanças, mas em conjunto todas contribuem para uma comunicação mais eficiente dos desenvolvimentos da partida e, consequentemente, capacitam-nos para fazermos decisões mais informadas.
Indo do lobby para Grizzco, podemos participar
em partidas de Salmon Run. Neste modo cooperativo, 4 jogadores defendem-se
de Salmonids e tentam obter os seus ovos (Golden Eggs) ao longo de três waves
de 100 segundos. Neste título, o modo passou a estar permanentemente
disponível e recebeu bosses adicionais refrescantes e “eventos especiais”
para waves que enriquecem a variedade das partidas. No final de algumas
partidas podemos ter de enfrentar um colossal King Salmonid com imensos pontos de vida! Mesmo que este vilão se revele um pouco repetitivo, é sempre prazeroso de suplantar. Ainda
mais valiosa é a nova opção de atirar os Power Eggs (ao custo de uma
quantidade avultada de tinta), uma mudança que impacta tanto e tão
positivamente as partidas que sou incapaz de regressar ao Salmon Run de Splatoon 2. Para além de promover a cooperação e coordenação entre participantes, esta mecânica confronta-nos
com um dilema risco-recompensa em situações tensas: devo atirar este ovo para perto do nosso cesto, ou preservar a tinta para garantir a minha sobrevivência?
A eliminação das restrições temporais de Salmon Run está longe de ser a única das frustrações que a Nintendo eliminou com Splatoon 3. Se um jogador se desconetar no começo de uma partida, esta será rapidamente interrompida, evitando assim que os restantes participantes desperdicem o seu tempo. Finalmente, temos a opção de cancelar a procura por partidas, pelo que se desistirmos de jogar já não é necessário forçar a consola a desconetar-se da internet. E soem os tambores, porque a minha principal prece foi acudida: agora é possível saltar os torturantes noticiários com as atualizações dos mapas e cenários transmitidos aquando da abertura do jogo! Só estou a galhofar parcialmente quando digo que é o principal motivo para, depois de centenas de horas jogadas, me sentir desencantado com Splatoon 2!
Ainda assim, a Nintendo não limpou a lista de afazeres. Por exemplo, o matchmaking
é interrompido se 3 minutos passarem sem que oponentes sejam encontrados, e
continuam a existir apenas 2 mapas por cada rotação de duas horas.
A todos estes ajustes empilham-se novidades extrínsecas. O lobby onde iniciamos partidas foi completamente reformulado, tendo-se tornado numa área explorável onde podemos treinar e “interagir” com os outros participantes enquanto esperamos pelo começo das partidas. Nele, dispomos também de um terminal onde podemos alterar a nossa alcunha, personalizar o fundo, insígnias e título da nossa Splashtag (uma faixa que nos identifica), ver replays das nossas partidas recentes ou mesmo doutros jogadores (através de códigos alfanuméricos), e escolher uma pose para a nossa animação de vitória. Possuímos ainda um cacifo pessoal que podemos personalizar com decorações (objetos e autocolantes) e que é visível para jogadores de todo o mundo.
Como devem ter reparado, todas estas funcionalidades são inéditas na série, e preenchem um vazio no campo das interações sociais, sem uma única microtransação! Para obtermos decorações, componentes de Splashtags e food tickets, basta usarmos o dinheiro que ganhamos nas batalhas numa máquina de cápsulas, ou numa nova loja especificamente dedicada a decorações. Só é pena que, estando estas atrações no lobby, não possamos desfrutar delas enquanto procuramos por partidas.
Há até uma nova forma de jogar,
se quiserem tirar um intervalo da jogabilidade central: as Tableturf Battles. Este
é um modo competitivo de cartas um contra um em que tentamos dominar mais área
de um tabuleiro do que o adversário, posicionando formas diversas em locais estratégicos para os pintar. Este é um jogo mais intrincado e viciante do que parece à
primeira vista, e torna Splatoon 3 num conjunto ainda mais completo.
Em alguns momentos esta análise pode parecer um changelog, mas é difícil mostrar o salto que Splatoon 3 representa face a Splatoon 2 doutra forma. É irremediavelmente sentida a falta de uma grande novidade que faça virar cabeças, especialmente numa plataforma onde já existe uma experiência Splatoon e após 5 anos de espera, mas a quantidade vasta de ajustes empregues faz desta uma entrada aprimorada que torna os predecessores obsoletos em comparação.
Ainda assim, há uma área em que Splatoon 2 permanece provisoriamente à frente do terceiro jogo: a quantidade de conteúdo. No momento da análise, Splatoon 3 possui apenas 12 mapas e um punhado de armas de cada categoria, e nem sequer conta com os modos passados League Battle e X Battle (que serão disponibilizados no futuro com alterações profundas). Estas lacunas serão certamente colmatadas nos 2 anos de atualizações que o novo título receberá, mas não deixam de ser desmoralizantes para quem saltar para o jogo no período de lançamento e se vir forçado a usar as suas armas preferidas com combinações de armas secundárias e armas especiais que não aprecia.
No que toca à apresentação audiovisual, Splatoon 3 é apresentado numa inabalável taxa de fotogramas 60FPS e segue o estilo visual do predecessor, mas com pequenos retoques. A maior mudança reside na tinta, que é agora menos refletiva e mais viscosa, facilitando o delineamento da fronteira entre tintas de cores diferentes. Por seu lado, a banda sonora não desilude, com várias composições que nos ficam na cabeça no Modo História e temas bastante variados nos modos online!
Conclusão
Com uma quantidade massiva de pequenos refinamentos e algumas adições inesperadas, Splatoon 3 é a iteração mais polida e robusta da série. Os modos de jogo online tornaram-se mecanicamente mais ricos e possuem uma interface mais elucidativa, e o Modo História é uma deleitosa surpresa que, pela primeira vez na série, merece ser encarado como uma paragem obrigatória.
Se nunca experimentaram a série, tão divertida hoje como aquando do seu nascimento, este é o ponto de entrada perfeito, representando Splatoon no seu apogeu. Se forem fãs de longa data, podem sentir a falta de uma novidade
profundamente sonante em relação a Splatoon 2, mas as melhorias de qualidade de vida e erradicação das frustrações passadas tornarão inimaginável regressar
ao jogo anterior.
O melhor
- Modo história de excelência;
- Miríade de ajustes de qualidade
de vida;
- Pequenas mas valiosas mecânicas
inéditas;
- Maior variedade no modo Salmon
Run;
- Adições secundárias, como
Tableturf Battle e decoração de cacifos, que tornam o pacote mais completo;
- Componente social expandida;
- Eliminação de várias frustrações que manchavam Splatoon 2, como os noticiários obrigatórios…
O pior
- …enquanto outras são inexplicavelmente
preservadas;
- Inexistência de uma grande
novidade, como um modo principal inédito.
Nota do GameForces: 9.0
Título: Splatoon 3
Desenvolvedora: Nintendo
Publicadora: Nintendo
Ano: 2022
Nota: Esta análise foi realizada com base na versão digital do jogo para a Nintendo Switch, através de um código gentilmente cedido pela Nintendo Portugal.
Autor: Tiago Sá
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