Lembram-se de
quando eramos miúdos e, no auge dos desportos radicais, todos nós tínhamos um
skate ou uns patins, e do quão divertido era simplesmente estar com amigos e
encontrar um pavimento liso no qual podíamos andar às voltas, com uma queda ou
duas tão dolorosas quanto engraçadas? Nessa altura, os fãs de skate
podiam satisfazer os seus desejos digitais com jogos como Tony Hawk’s Pro Skater, Skate ou, mais recentemente, OlliOlli, enquanto
os que preferiam andar de patins tinham Jet Set Radio e pouco (ou nada)
mais. Mas Rollerdrome chegou para dar aos fãs de patinagem um novo escape
em forma de videojogo – e um escape bem violento, diga-se. Mas será Rollerdrome
a experiência radical dos nossos sonhos, ou teremos vontade de lhe pôr um par
de patins e a andar para fora da nossa memória?
Em Rollerdrome,
somos convidados a mergulhar num futuro próximo distópico, no qual das grandes
corporações dominam o mundo através do seu avassalador poderio financeiro. Com
esse poderio, foi criado um desporto que turva os limites entre a competição e
a violência, funcionando como torneio anual. É aqui que entra a nossa
protagonista, Kara Hassan. Esta jovem novata participa pela primeira vez no
torneio com a ambição de levar a taça. Para tal, terá de participar em
confrontos violentos contra variadíssimos inimigos, armados com um vasto leque
de armas mortíferas, e sobreviver até ser a única de pé. É uma premissa simples
e que rápida e eficazmente nos motiva a fazer tudo o que está ao nosso alcance
para ver Kara triunfar.
Até porque Rollerdrome
vai contando aqui e ali algumas micro-histórias que dão um pouco mais de cor e
nuance à narrativa. A jogabilidade divide-se em dois momentos – um de
exploração na primeira pessoa e um de combate na terceira pessoa. Nos momentos
de exploração, podemos levar Kara a navegar por balneários, escritórios e salas de
conferência, encontrando várias cartas, bilhetes ou trocas de mensagens entre
alguns dos outros participantes e os organizadores do torneio. É aqui que
encontramos algumas das micro-histórias, que revelam favoritismos, manipulação
da dificuldade que cada participante enfrenta, e corrupção em geral, cimentando a nossa vontade de triunfar e levar a melhor sobre a podridão deste mundo.
Rollerdrome apresenta uma estrutura muitíssimo próxima da de um
jogo de arcada, com um total de 11 níveis divididos por quatro etapas do
torneio – dos oitavos de final até à final. Cada nível tem 10 objetivos para
cumprir, que variam entre atingir uma certa pontuação, realizar truques
específicos ou matar adversários com as armas indicadas. Para progredirmos para
a próxima etapa do torneio temos de completar todos os níveis (ou seja,
assassinar todos os inimigos que surgem) ao mesmo tempo que concretizamos um
determinado número de objetivos. Este é, portanto, um jogo de arcada, tanto na
forma como no conteúdo, que nos incentiva bastante a regressar a níveis
anteriores para conseguir aquele objetivo chato que nos escapou. Tudo isto
coaduna-se perfeitamente com a jogabilidade intensa e veloz que esta
experiência nos confere.
Sim, é quando
ficamos em controlo de Kara Hassan e a levamos a entrar na arena que Rollerdrome
passa de uma experiência engraçada para algo verdadeiramente de especial. A
jogabilidade é bastante simples de aprender. Basta um empurrão no analógico
direito para Kara andar sozinha (apenas temos de nos preocupar em orientá-la na
direção que queremos). Depois, podemos saltar, desviar-nos, usar um botão para
fazer truques no ar, usar outro para deslizar em superfícies com pouca área de
contacto (corrimões ou cantos de paredes), usar o gatilho esquerdo para
desacelerar o tempo, e usar o gatilho direito para disparar.
É usando este
esquema de controlos simples que temos de ir eliminando todos os inimigos que
vão sendo colocados em todos os cantos da arena, inicialmente apenas com um par
de pistolas, mas com outras três armas a serem desbloqueadas ao longo da
campanha, cada qual com a sua especificidade e utilidade estratégica. As armas
têm um número de munições limitado, podendo ser recuperadas à
medida que vamos desempenhando truques. Esta opção de design aparentemente
simples revela-se um golpe de génio, que nos indica implicitamente que o modo
ideal de abordar cada nível é ir combinando de disparos, truques e
desacelerações de tempo em diferentes sequências, de modo a encadear mortes e
atingir pontuações astronómicas. Mas, acima de tudo, esta é uma opção de design
que dá ao jogo tanta velocidade e tanto estilo, que é impossível não nos
sentirmos entusiasmados cada vez que carregamos num botão do nosso comando.
Mas atenção, que
toda esta simplicidade mecânica não significa que Rollerdrome seja um
jogo fácil, bem pelo contrário. O número de inimigos que enfrentamos em cada
nível é sempre elevado, aumentando à medida que vamos avançando no torneio.
Para além disso, a variedade de inimigos que podemos encontrar é impressionante
– desde simples capangas com tacos de beisebol, passando por atiradores
furtivos e chegando a “mechs” ou a adversários que empunham armas laser, há um
pouco de tudo o que se pode imaginar. Portanto, para além da quantidade, temos de
lidar com combinações de inimigos cada vez mais complexas e difíceis de
contrariar, sendo comum encontrarmo-nos numa arena cheia até ao tutano onde
todos têm um único alvo a abater: a nossa protagonista, Kara Hassan.
Este é, portanto,
um jogo bastante desafiante, cuja dificuldade leva a uma longevidade de cerca
de 3 ou 4 horas. Mesmo havendo apenas 11 níveis passíveis de serem completados
em cerca de 5 minutos cada, é natural que tenhamos de ir repetindo várias vezes
o mesmo nível, quer seja por sermos assoberbados pelos nossos inimigos
implacáveis, quer seja pelo facto de necessitarmos de realizar mais desafios
para poder progredir para a próxima etapa. Felizmente, não precisamos de
concluir o nível para que um desafio cujos critérios sejam cumpridos fique
registado como concluído. Isto torna possível regressar a um nível com um ou
dois objetivos em mente, cumprir os seus critérios rapidamente, voltar para a
escolha do nível e avançar na história, tornando a progressão muito menos frustrante do que
poderia ser.
Mas nem tudo são
rosas em Rollerdrome, havendo outros aspetos do jogo que podem muito bem
gerar frustração. Primeiro, os saltos de dificuldade são, por vezes,
excessivos, podendo passar de um nível que conquistámos com uma perna às costas
para outro onde rapidamente nos sentimos completamente impotentes. Depois, os ataques inimigos são bem indicados, mas a mera quantidade de ataques
diferentes que nos têm na mira podem ser simplesmente demais e não estar
devidamente representados no ecrã, levando-nos a sofrer dano sem sabermos como nem de onde. A câmara também pode ser motivo de
frustração, podendo colidir com algumas paredes das arenas e trocar-nos as
voltas quanto à direção para a qual Kara Hassan se está a deslocar. Mais que
tudo isto, temos de lamentar a existência de apenas duas batalhas contra um
boss – e sim, o singular é propositado, uma vez que é contra o mesmo inimigo, e
o método de o derrotar é exatamente igual em ambas as batalhas. Quando é
feito um esforço para alargar a história do mundo (referindo, por exemplo, a
existência de outros concorrentes), é bastante desapontante não se ter
aproveitado para criar confrontos com bosses mais variados e envolventes.
Voltando ao que Rollerdrome
faz de incrivelmente bem, olhemos para a direção artística. Verdade seja dita,
difícil é parar de olhar para os ambientes vibrantes, as cores impactantes, a lineart
saliente, as animações impecáveis e os efeitos atraentes. Como se pode deduzir,
adoramos tudo o que o jogo tem para nos oferecer visualmente, e não só pela
qualidade do estilo à lá banda desenhada. A utilização de cores tão
contrastantes e saturadas acaba por ser um apoio indispensável à jogabilidade.
Isto ajuda-nos a perceber rapidamente quando novos tipos de inimigos surgem na
arena, já que cada um tem uma cor específica atribuída, seja ao seu ataque ou
ao seu modelo.
E claro que tudo
isto apenas é enaltecido pelo facto de o jogo correr consistentemente a 60
fotogramas por segundo. Seja a patinar em alta velocidade, a meio de uma cadeia
de truques enquanto se está no ar, com o tempo desacelerado ou com mais de uma
mão cheia de ataques ou explosões a tentarem matar-nos ao mesmo tempo, não
percecionamos qualquer quebra na framerate.
Por fim, temos de
terminar com outro aspeto do jogo que peca um pouco: o design sonoro. Enquanto
os efeitos sonoros dos disparos, das esquivas perfeitas, das explosões de
rockets ou de satos e derrapagens cumprem os seus propósitos bem o suficiente, é
a banda sonora que deixa algo a desejar. Não há uma única trilha memorável, e
nunca sentimos que a música enaltecesse por aí além os momentos de maior tensão
ou em que Kara Hassan corre mais perigo. É algo a lamentar, já que uma banda
sonora mais variada, ou, eventualmente, mais adaptável aos acontecimentos de
cada nível, poderia ter elevado toda a experiência para outro patamar.
Conclusões
Rollerdrome é tudo o que os fãs de desportos radicais e de violentos jogos de ação poderiam desejar. A ação é frenética, visualmente deliciosa e incrivelmente divertida, havendo poucas coisas mais gratificantes do que encadear vários truques e piruetas enquanto se elimina hostis com caçadeiras apontadas à nossa cabeça. Há alguns problemas que geram ocasionais momentos de frustração, e algumas decisões que acabam por não potenciar ao máximo o conceito deste jogo. Mas nada impede Rollerdrome de ser uma experiência tão cativante quanto estilosa, que é um deleite de ver e de jogar em igual medida.
Rollerdrome é tudo o que os fãs de desportos radicais e de violentos jogos de ação poderiam desejar. A ação é frenética, visualmente deliciosa e incrivelmente divertida, havendo poucas coisas mais gratificantes do que encadear vários truques e piruetas enquanto se elimina hostis com caçadeiras apontadas à nossa cabeça. Há alguns problemas que geram ocasionais momentos de frustração, e algumas decisões que acabam por não potenciar ao máximo o conceito deste jogo. Mas nada impede Rollerdrome de ser uma experiência tão cativante quanto estilosa, que é um deleite de ver e de jogar em igual medida.
O Melhor:
- Premissa simples, mas com pequenas narrativas que tornam o mundo interessante
- Direção artística colorida, vibrante e estonteante
- Jogabilidade é incrivelmente divertida e os níveis são desafiantes
- Boa variedade de armas e de inimigos, mas…
- … Batalhas boss são muito pouco apelativas
- Alguns problemas de câmara podem levar a momentos de frustração
- A banda sonora deixa algo a desejar
Pontuação do
GameForces – 8.5/10
Título: Rollerdrome
Desenvolvedora: Roll7
Publicadora: Private Division
Ano: 2022
Nota: Esta análise foi realizada com base na versão digital do jogo para a PlayStation 5, através de um código gentilmente cedido pela Best Vision.
Autor da Análise: Filipe Castro Mesquita
Análise | Rollerdrome – Violentamente Estiloso
Reviewed by Filipe Castro Mesquita
on
agosto 24, 2022
Rating:
Sem comentários: