Os jogos que recorrem a um elevado nível de dificuldade para entregar uma experiencia diferenciada estão na moda. Desde Cuphead à série Souls, diversos são os títulos que conseguiram uma sólida posição de mercado e viram reconhecidas as suas qualidades.
Ainda assim, esta “moda” está longe de ser algo original à última década. De facto, desde os primórdios dos jogos de vídeo que os produtores têm utilizado a dificuldade como uma forma de prolongar a experiencia de jogo. Principalmente numa altura, onde eram raras as expansões de conteúdos físicas ou a internet ainda se encontrava numa fase embrionária para tornar DLCs de extensos conteúdos num conceito viável.
(De notar que esta análise corresponde à versão PS4 do jogo, experienciada numa PS5 através da retrocompatibilidade. Futuras versões PS5 nativas ou experiências de jogo na PS4 ou PS4 Pro poderão diferir um pouco, sobretudo no que toca a aspetos técnicos.)
Shin Megami Tensei é uma série de RPG, com uma forte componente oriental, onde os jogadores são recompensados (demasiado?) linearmente com o tempo que despendem nele. O terceiro lançamento da série principal (relembramos que os famosíssimos Persona são spin off desta série), apresenta-se agora numa versão remasterizada e que conta com uma quantidade de melhorias substanciais, principalmente no que toca a limar um pouco do elevado nível de dificuldade do título que saiu originalmente em 2003.
Os jogadores da playstation 2 devem lembrar-se de algumas mecânicas que tornavam este título num verdadeiro pesadelo, desde o grindding obrigatório para conseguir derrotar algumas secções do jogo, à falta de informação no que se refere ao que realizar dentro do jogo (por exemplo no que se refere a fusões). Felizmente a Atlus implementou nesta remasterização uma quantidade significativa de alterações conhecidas por QoL (Quality of life), que permitem aos jogadores actuais ter uma experiencia mais dentro do padrões actuais. Ainda assim, para os mais puristas, estas mesmo opções podem ser ignoradas, se pretenderem ter uma experiencia idêntica ao original (somente com melhorias gráficas).
A principal novidade é efectivamente o modo “Merciless”, onde os jogadores recebem boosts enormes, recebendo metade do dano dos ataques sofridos, provocando o dobro nos realizados. Adicionalmente, os encontros aleatórios encontram-se mais espaçados e iremos receber mais do dobro de dinheiro e experiencia. Os níveis de dificuldade são ainda possíveis de mudar a qualquer altura do jogo, permitindo um melhor ajuste para evitar uma experiencia extremamente simples ou demasiado exigente.
Também as mecânias de fusão tem agora a possibilidade de escolher quais as habilidades herdadas, ao invés do sistema aleatório existente no original. Por fim, uma outra melhoria é a possibilidade de agora podermos gravar em qualquer lugar, reduzindo bastante a dificuldade da existência de save points demasiado espaçados existente no original.
Efectivamente estas alterações promovem uma experiencia mais acessível, mas que não deixa de ter a sua dificuldade. Durante o nosso jogo percorremos sempre na dificuldade “normal”, aproveitando contudo as demais melhorias (principalmente no que se refere a herdar as habilidades que mais convinha à nossa equipa). Ainda assim, diversas foram as ocasiões que notamos picos de dificuldade que nos levou a gastar tempo em grindding desnecessário e sem conteúdo relevante à experiencia. Este aspecto leva-nos a ponderar que a Atlus poderia ter mexido um pouco mais no balanceamento de dificuldade dessas zonas, com vista a estar mais equilibrado com a progressão típica de um jogador standard.
Mas as melhorias que a Atlus poderia aproveitar não param aqui. Ainda que o jogo apresente cenários renovados, novos efeitos de luz e novos modelos, os vídeos continuam com a mesma resolução e formato da PS2, destoando bastante do global da experiencia. No que se refere à componente áudio-visual, a icónica banda sonora de autoria de Shoji Meguro também sofreu um tratamento (ou falta deste) muito pouco digno, apresentando uma qualidade de reprodução baixíssima. Este aspecto é incompreensível, quando a Atlus tinha ao seu dispor toda uma banda sonora reformulada na colectânea da edição de director relançada em 2005 e já com uma qualidade bastante superior.
Não obstante, Shin Megami Tensei 3 HD Remaster é graficamente bem conseguido e salvo estes dois pontos, torna-se numa experiencia impressionante por alturas, mesmo que constantemente denotando já a sua idade. Não somente na sua componente áudio-visual, como nas mecânicas de jogo e progressão da personagem. Claramente, para os fãs de Persona, irão reconhecer diversas caracteristicas no sistema arcaico existente no sucesso da Atlus. Também neste Remaster, estamos perante um jogo por turnos, onde um dos principais objectivos é descobrir quais as fraquezas dos adversários e tentar capitalizar o máximo possível. Contudo, outros aspectos começam a ser difíceis de digerir, como por exemplo a navegação nos menus que poderia ser mais intuitiva, ou então as fusões que poderiam dar mais hipóteses para descobrir “aquela” persona que precisamos de fundir.
É efectivamente uma experiência agridoce, que somente consegue justificar o interesse dos jogadores actuais pela sua história e enredo. Claramente, a história de Shin Megami Tensei 3 é a melhor componente do jogo. Shin Megami Tensei 3 decorre numa versão peculiar de Tóquio, diferenciada do resto da série SMT e onde facilmente notamos que algo não está certo. Um culto tem criado problemas por toda a cidade e existem rumores de que o mundo está sendo refeito devido a um evento apocalíptico denominado de "Concepção". Após a ocorrência deste evento, o protagonista é apanhado no fogo cruzado e torna-se num híbrido humano-demónio com o objectivo de sobreviver neste novo mundo pós-apocalíptico cheio de demónios e almas perdidas.
Com o decorrer da aventura teremos de construir uma espécie de equipa de demónios, capturando-os muito ao estilo de Pokemon, ainda que seguindo uma mecânica demasiado aleatória para quem quiser coleccionar todos os demónios. Com o evoluir da história, as interacções com as outras personagens, amizades feitas e escolhas assumidas levarão a afinidade da nossa personagem por um caminho e destino final diferenciado.
O título apresenta um pacing saudável no que se refere à sua história e tende a não encher com conteúdo desnecessário, o que é uma mais valia. Contudo, a caracterização das personagens, salvo as principais, revela-se um pouco aquém dos standards que actualmente, ou mesmo na época do original, estávamos habituados. Não obstante o world setting diferenciado e uma história cativante é suficiente para capturar a atenção dos jogadores ao longo da experiencia. Também no que se refere à caracterização das personagens, a nova vocalização em inglês apresenta um bom nível de empenho e qualidade por parte dos actores, colmatando um pouco o aspecto previamente mencionado.
Conclusão
Shin Megami Tensei é uma obra memorável daquilo que a série representa. A Atlus fez um óptimo trabalho no que se refere a actualizar o título às dinâmicas actuais dos vídeo-jogos. Ainda assim notamos que existem pontos significativos que deviam ser melhorados. Principalmente no que se refere aos vídeos e banda sonora, os quais a experiencia poderia ser significativamente melhorada. Não obstante, é a versão que melhor e mais facilmente permite aos jogadores actuais experimentar a série e conhecer as origens das mecânicas, designs e temáticas dos seus Spinoffs.
Prós:
- Grafismo completamente reformulado;
- História e Enredo cativantes;
- Melhoramentos em diversas mecânicas dentro do jogo.
Contras:
- Falha em renderizar ou criar novos vídeos;
- Banda sonora com reprodução de baixíssima qualidade.
Pontuação do GameForces: 7.5/10
Título: Shin Megami Tensei 3 – HD Remaster
Desenvolvedora: Atlus
Publicadora: Atlus
Ano: 2021
Artigo por: Carlos Silva
[Análise] Shin Megami Tensei 3 HD Remaster [PS4]
Reviewed by Carlos Silva
on
junho 12, 2021
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