[Análise] Animal Crossing: New Horizons [NSW]


Vou ser honesto: não sou fã de Animal Crossing. Tentei dar uns toques no Animal Crossing: New Leaf para a 3DS, mas este simulador de vida com animais antropomórficos não me convenceu. Dado este histórico com a série, dar o salto para New Horizons tinha tudo para dar para o torto. E é por isso que me custa a acreditar nas dezenas de horas que passei no jogo! 

Este fosso no meu tempo iniciou-se quando Tom Nook me levou num retiro para uma ilha deserta, juntamente com os seus aprendizes e dois outros viajantes. Um lugar completamente à margem da sociedade, com traços desenhados por resplandecentes rios, praias e inúmeras laranjeiras, nas minhas mãos para ser moldado de acordo com os meus caprichos.


No entanto, esta não é uma tarefa fácil! Tal como todos os Animal Crossing anteriores, New Horizons funciona em tempo real. Por isso, não se pode esperar que se possa fazer tudo o que se deseja num só dia. Em algumas ocasiões, podemos chegar mesmo a um ponto em que não temos mais nada a fazer até o sol dar outra volta sobre este pequeno mundo. Em consequência, o desenvolvimento da ilha é um cometimento lento que poderá demorar várias semanas. Esta dinâmica pode afastar algumas pessoas, mas para mim é uma parte do charme do jogo: New Horizons não é algo que jogamos intensamente horas e horas a fio, mas sim um relaxante escape que visitamos e melhoramos a cada dia.

Portanto, se queremos avançar nesta empreitada, temos de lhe dedicar tempo, mas também afinco e árduo trabalho. Enquanto que nos jogos anteriores obtínhamos os nossos itens principalmente na loja Nook Cranny, aqui há uma especial ênfase no novo sistema de crafting. Numa série em que a recolha de recursos ambientais (como fruta, fósseis e insetos) está no centro da jogabilidade, a possibilidade de usar os materiais que recolhemos para construir todo o tipo de parafernálias é uma evolução natural. Esta adição deu todo um outro significado àquilo que antes apenas servia para vender, doar ao museu ou oferecer a outro residente, ao mesmo tempo que tornou a obtenção de certos itens num processo mais personalizado. Graças a este sistema e a uma valiosa melhoria ao inventário, senti-me investido no ciclo de jogabilidade como não me tinha sentido em New Leaf.

Outra grande novidade de New Horizons é a nova moeda - Nook Miles. Enquanto as Bells são obtidas através da venda de itens, as Nook Miles são dadas ao jogador como recompensa por determinadas ações, tais como apanhar peixes, falar com vizinhos ou tirar fotografias. É com esta nova moeda que pagamos o custo da nossa viagem no começo do jogo, naquilo que é uma excelente forma de fazer o jogador autonomamente descobrir os pilares da jogabilidade. Mesmo após pagarmos a dívida, as Nook Miles mantêm-se relevantes ao longo da experiência devido à existência de uma gama de produtos que só podem ser adquiridos com elas e à opção de trocar Nook Miles por Bells.


Vamos, por isso, passar a maior parte do tempo no jogo a realizar pequenas tarefas como apanhar ervas daninhas, derrubar árvores, caçar insetos, pescar e minerar pedras. Parece monótono? É porque é. Mas o prazer de New Horizons não reside intrinsecamente nelas, mas sim no seu resultado. Pode ser às vezes repetitivo e cansativo, mas no fundo sentimos ânimo porque estamos cada vez mais perto de construir aquele baloiço que tão bem ficaria no nosso jardim, ou comprar ao Timmy e Tommy aquele gnomo que nos anda a fazer olhinhos ou finalmente pagar a minha milionésima expansão da casa que eu definitivamente precisava. Sou apenas humano, bolas!

Com este ciclo de labuta vamos dando vida à ilha, dia após dia. Mais do que nunca perspetivamos esta comunidade como um cantinho só nosso. Em grande parte, isto deve-se a termos um controlo bem maior no layout deste pequeno mundo virtual: já no primeiro dia, somos nós quem decide onde é que ficam as tendas dos 3 primeiros residentes (que mais tarde, dão lugar a casas). Esta liberdade de escolha mantem-se ao longo do jogo: não só podemos eleger o local das casas de futuros moradores, mas também onde serão construídas as lojas e o museu da terra. Como se não bastasse, mais tarde passamos a ter a opção de construir pontes e escadas, e até de moldar a geografia da ilha! Quando tomamos em conta que agora podemos colocar praticamente todos os nossos itens decorativos no exterior, vemos que o salto foi enorme naquilo que podemos fazer com a localidade em relação ao New Leaf.


Esta transformação gradual da ilha de uma tábua rasa para uma região desenvolvida torna a nossa progressão e impacto no local mais evidente do que nunca e aumenta o carinho que temos pela região. Mas não é só este pedaço de terra que evolui! O nosso avatar humano também vai, lentamente, tornando-se uma personagem bem capaz. Este crescimento passa principalmente pela aquisição uma variedade de ferramentas, que nos permitem atravessar rios, subir elevações e recolher uma maior diversidade de matérias-primas. 

Mas a coisa eventualmente abranda: a progressão acaba por estancar e deixamos de ter objetivos precisos. Já foram prometidas atualizações com novos eventos e conteúdos, sendo que pudemos vivenciar um evento do jogo inspirado na Páscoa no começo de abril. Mas enquanto esperamos pelos novos conteúdos, a vida na ilha resume-se aos pequenos prazeres: descobrir os novos itens à venda, falar com os habitantes, decorar a localidade… Mesmo que não tenha algo específico para fazer, o desejo de descobrir as surpresas que a região me reserva traz-me de volta a ela. Num dia assisto a uma chuva de estrelas, noutro encontro um náufrago na costa da ilha… Acabo a matutar: “O que mais estará o jogo a esconder de mim?”


Infelizmente, muitas vezes a resposta é “a mesma coisa, dia sim dia não”. A repetição é, sem dúvida, o maior problema de New Horizons. E não me estou a referir ao ciclo de jogabilidade: embora este se resuma a fazer as mesmas tarefas vezes e vezes sem conta, as pequenas recompensas são frequentes o suficiente para me manter motivado. Se no primeiro encontro com o náufrago Gulliver é entusiasmante ajudá-lo, o mesmo não se pode dizer das vezes seguintes, em que ele nos pede auxílio com a mesma tarefa usando exatamente o mesmo diálogo. Aquilo que era inicialmente uma bem-vinda novidade rapidamente se tornou num incremento à lista de afazeres.

Não são apenas os visitantes ocasionais que interrompem a repetição com mais repetição: os próprios residentes também contribuem para adensar este problema. Cada um deles tem peculiaridades únicas, e não falta curiosidade de saber o que eles nos têm a contar. Para minha tristeza, pouco demora até estes vizinhos começarem a repetir as suas linhas. Admito que seria insensato esperar que eles tivessem coisas infinitas para dizer. Contudo, a certo ponto torna-se difícil dedicar-lhes a nossa atenção quando a sua presença é tão artificial. O seu dia resume-se a varrer um chão limpo, cantar e perseguir insetos que nunca apanham. É compreensível que o seu impacto na ilha seja diminuto para minimizar as interferências ao jogador, mas esta presença inócua leva a uma desconexão para com eles.


O pior é quando os diálogos repetidos estão interligados com os sistemas de jogo: por exemplo, de cada vez que doo um fóssil ao museu, tenho de passar por 17 linhas de diálogo, que nunca mudam. A insistência da Nintendo em complicar o simples é origem de múltiplas frustrações como esta, que me deixam a fazer perguntas como: Porque é que quando acedo à mesa de workshop, o jogo me questiona desnecessariamente se quero usar a mesa? Porque é que só posso fazer um item DIY de cada vez? Porque é que se tiver 10 laranjas na mão não posso vender 3 sem ter de as separar uma a uma?

Estes problemas, embora menores, acabam por levar a um desgaste ao longo do tempo. É por esta forte repetição e pelo facto de o jogo não ter um objetivo per se que é necessário frisar que Animal Crossing não tem apelo universal. Mesmo quando o jogo coloca algumas metas à nossa frente, somos nós quem realmente decide quais os nossos objetivos neste mundo virtual. Quem não for paciente nem vir apelo na ideia de um jogo sem um fim real, em que a nossa principal motivação é o desejo de construirmos um local ao nosso gosto, deve ponderar cuidadosamente a compra.


Há também a considerar que apenas é possível ter uma ilha por consola. Se outros membros da família também quiserem criar a sua ilha, terão de comprar uma Nintendo Switch própria. As contas adicionais na consola podem ser usadas, mas apenas como habitantes na ilha do jogador principal. Cada novo jogador é integrado na comunidade, tendo até direito a uma moradia sua. No entanto, estes jogadores terão de lidar com limitações importantes ao nível das interações e da progressão. Pelo lado positivo, esta escolha favorece o multijogador local: até quatro habitantes podem estar a jogar em simultâneo na mesma consola. Se, a solo, ter de viver numa ilha partilhada pode ser desapontante, em cooperativo há um sentimento de união quando os jogadores se juntam com um objetivo comum.

Mas seria injusto concluir esta análise negativamente. Por mais que eu aponte falhas a New Horizons, a verdade é que a cada dia regresso ao jogo. Passo o tempo a resmungar, mas lá estou, a fazer as voltas do costume. Isto porque, no meio da pilha de eventos repetidos, há sempre acontecimentos especiais que fazem com que valha a pena, já para não falar do inegável regozijo que sinto ao embelezar a ilha. 


Conclusão
Num mundo em constante mudança, New Horizons é um escape idilico que nos dá a oportunidade de criarmos um pequeno mundo só nosso. Com vastas possibilidades de customização, que prometem ser expandidas por futuras atualizações, e uma cativante comunidade, rapidamente nos vemos imersos neste pequeno mundo virtual. Mas nem todos se sentirão desta forma: as metas são auto-impostas pelo próprio jogador e há uma enorme (e em partes desnecessária) componente de repetição, o que poderá entrar em conflito com certas personalidades.

O melhor
- Excelente apresentação;
- Cantinho relaxante;
- Ótima curva de progressão;
- Enorme liberdade de customização;
- Multijogador local pacífico e divertido.

O pior
- Sentido de repetição;
- Sistema arcaico de dados de gravação;
- Burocracia desnecessária nos menus.

Nota do GameForces: 7.5

Nota: esta análise foi realizada com base na versão 1.1.4 de Animal Crossing: New Horizons. As funcionalidades dependentes do serviço Nintendo Switch Online não foram testadas pelo autor.

Título: Animal Crossing: New Horizons
Desenvolvedora: Nintendo
Publicadora: Nintendo
Ano: 2020

Autor da Análise: Tiago Sá

[Análise] Animal Crossing: New Horizons [NSW] [Análise] Animal Crossing: New Horizons [NSW] Reviewed by Tiago Sá on maio 02, 2020 Rating: 5

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